Mayara Toni
Nos últimos anos, o sistema federal de educação superior passou por um intenso processo de expansão, promovido pelo governo federal e incentivado pela sociedade em geral. Novas universidades federais, novos campi, novos cursos de graduação, pós-graduação e extensão estão sendo oferecidos, ampliando o acesso à educação pública de qualidade, embora ainda aquém das necessidades do país.
Esse crescimento trouxe consigo também o aumento do número de profissionais que pudessem suprir a demanda inevitável. Mais do que nunca, o novo quadro coloca em pauta a questão da democracia no âmbito da universidade pública. Como enfrentar os inúmeros problemas provocados por uma crônica falta de recursos? Como integrar milhares de novos professores e alunos à vida universitária, preservando a autonomia da instituição, a liberdade de cátedra e a qualidade do ensino? Como assegurar um processo de interlocução transparente e produtivo com a sociedade?
Todas essas questões, e muitas outras que poderiam ser agregadas, remetem ao processo decisório no âmbito das universidades, reintroduzindo com força o debate sobre a paridade, tema recorrente na luta pelo ensino público, gratuito e de qualidade no Brasil. A ideia da paridade consiste em um processo de eleição nas universidades que garantem aos três segmentos, estudantes, professores e técnicos administrativos, o direito ao voto com igual peso.
Os desafios postos pelo processo de expansão são sentidos de forma particularmente intensa pela Unifesp, dadas as características específicas da universidade: em menos de uma década, o número de estudantes na graduação foi multiplicado por oito em apenas seis anos – de 1.200 para quase 10 mil. Cerca de 1.400 docentes atuam em diferentes áreas, nos seis campi situados na Grande São Paulo, na Baixada Santista e em São José dos Campos. Por outro lado, houve pouco aumento no número de técnicos administrativos. Como resultado, a estrutura ficou deficiente.
Como tentativa de criar um quadro de reflexão capaz de apontar perspectivas, não apenas para o seu próprio futuro, mas para as universidades públicas federais em geral, a Reitoria da Unifesp propôs a realização de um Fórum em Defesa da Educação Pública, em 10 de abril, com um debate realizado no anfiteatro central da Unifesp, e outros organizados em todos os campi. Procurou-se, com isso, estimular a participação da comunidade acadêmica, tanto no processo de reflexão quanto na elaboração de uma prática capaz de assegurar a democracia na instituição.
Na ocasião, foi aprovado um manifesto que vincula o processo de democratização à adoção de políticas públicas capazes de estender o ensino público superior ao conjunto dos jovens e trabalhadores brasileiros: “Os desafios da democratização do acesso à educação superior de qualidade ainda estão longe de serem vencidos. Uma das metas do atual Plano Nacional de Educação é a de elevar a taxa de matrícula para 33% da população de 18 a 24 anos e assegurar a qualidade da oferta e expansão para, pelo menos, 40% das novas matrículas, no segmento público. Para além da expansão quantitativa, é fundamental a defesa da qualidade do ensino superior, assim como a garantia de recursos adicionais de custeio proporcionais à expansão já alcançada, ampliando ações afirmativas e de assistência estudantil”.
O fórum previa a criação de um processo de interlocução permanente junto à comunidade universitária, parlamentares, intelectuais, entidades representativas e organizações sociais afins, em defesa do orçamento da educação e do financiamento que garanta o crescimento e consolidação da educação pública e de qualidade. “É fundamental que tenhamos uma política econômica que permita os diretos da Educação. Esse é o início de um movimento com o qual acreditamos conquistar a adesão por parte de reitores, entidades, organizações e a sociedade. Temos esperança que o novo ministro da Educação e a presidente Dilma tenham a sensibilidade da educação como direito e estamos aqui para ajudar e apresentar as nossas capacidades para a pátria educadora”, afirmou a reitora Soraya Smaili.
Como desdobramento desse processo, a Reitoria organizou audiências públicas concentradas no debate sobre experiências de democratização nas universidades, incluindo a questão da paridade, reivindicação constante dos servidores públicos e da comunidade acadêmica. Em agosto, participaram a reitora Soraya Smaili, o reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Roberto Leher, o vice-reitor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Álvaro Penteado Costa e o assessor da Reitoria da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Marco Antonio Zabotto.
A audiência foi aberta pela apresentação dos sistemas de participação da comunidade nas universidades, dando a palavra aos representantes componentes da mesa. A Unifesp procurou trazer para o debate experiências diferentes das que a instituição vive atualmente, com a finalidade de agregar conhecimento para os presentes. “Nós buscamos trazer experiências que já são de longa data como a federal do Rio de Janeiro, a federal de São Carlos e também a Unicamp”, explicou Soraya Smaili.
Diante das experiências apresentadas, o debate foi aberto para a comunidade apresentar suas questões sobre o assunto. Entre reivindicações e dúvidas, o assunto sobre paridade prevaleceu. As perguntas foram pontualmente respondidas pelos presentes. “O tema da paridade faz parte dessa experiência de democracia nas nossas universidades”, apontou Soraya.
Em setembro, dando continuidade à ação, estiveram presentes na universidade o Prof. Dr. André Rubião Resende, representante da Unifenas e Faculdades Milton Campos (MG) e autor do livro História da Universidade: Genealogia do Modelo Participativo, o presidente da Associação dos Docentes da Unifesp (Adunifesp), Prof. Dr. Rodrigo Medina Zagni e o Prof. Dr. Félix Ruiz Sanchez, representando a Reitoria da Unifesp.
Na ocasião, os presentes foram contemplados com palestras e discussões presentes no livro citado, no qual Rubião conta como os modelos históricos de gestão das universidades pelo mundo influenciam as decisões modernas, além de demonstrar formas de praticar as questões de paridade e democratização com base nesses estudos.