A democracia é incompatível com a tortura. Há muitas maneiras de definir a democracia, mas todas concordam em um elemento comum: a democracia é o regime que permite resolver as diferenças pelo diálogo.
Por ser a casa onde se escrevem as leis, após tantos debates e deliberações quanto forem necessários pelos representantes do povo eleitos pelo voto popular, a Câmara dos Deputados representa o símbolo maior da democracia. Já a tortura impossibilita qualquer forma de diálogo ao levar a vítima de tortura ao limite do humano com o único objetivo de a humilhar e forçar a aceitar o ponto de vista do torturador.
Por acreditar na democracia e nos posicionar contra qualquer forma de tortura, a Comissão da Verdade Marcos Lindenberg vem a público repudiar veementemente o discurso do deputado federal Jair Bolsonaro (PSC/RJ) que, na votação ocorrida no dia 17 de abril de 2016, dedicou o seu voto a favor do impeachment da presidenta da República Dilma Rousseff a um notório torturador: “Pela memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff”, tendo sido ovacionado por muitos deputados ali presentes.
Ustra chefiou o DOI-Codi do IIº Exército, em São Paulo, entre 1970 e 1974, sendo responsável por dezenas de mortes e pela tortura de incontáveis vítimas, algumas das quais deram emocionados depoimentos para esta comissão. Em decisão histórica, pronunciada pelo juiz Gustavo Santini Teodoro, da 23ª Vara Cível de São Paulo no dia 9 de outubro de 2008, Ustra se tornou o primeiro oficial condenado na Justiça brasileira em uma ação declaratória por sequestro e tortura durante o regime militar (1964-1985).
Conclamamos o senso de dignidade e decência dos deputados federais a se posicionarem sobre esta questão. Das duas uma, ou os deputados confirmam a vocação democrática da casa à que pertencem e revogam o mandato de Bolsonaro, ou os deputados apoiam a atitude do deputado, abraçam a barbárie e dão as costas à democracia.
A questão é grave e exige um posicionamento claro, pois não toleramos mais atitudes que se configurem como a cumplicidade passiva do silêncio.
TORTURA NUNCA MAIS!
Centro de Antropologia e Arqueologia Forense (CAAF/Unifesp)
Comissão da Verdade Marcos Lindenberg (CVML/Unifesp)