Imagem criada com a fotografia de Francisco Martins (formigas) e do desenho esquemático do pesquisador (redes)
Faça como as formigas
Algoritmo que imita comportamento dos insetos aumenta a confiabilidade na entrega de mensagens e reduz o consumo de energia em ambientes urbanos de alta complexidade
Ana Cristina Cocolo
De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), mais da metade da população mundial já vive em megacidades e, até 2030, esse percentual pode chegar a 70%. Com esse cenário, é possível que problemas como poluição, enchentes, trânsito, entre outros, também cresça. É nesse momento, que a tecnologia nos permite, hoje, vislumbrar um futuro cada vez mais promissor para as Cidades Inteligentes (smart cities). O uso intenso de ferramentas para monitorar, transformar, planejar, prever e solucionar problemas de grandes centros urbanos ganhou força nos últimos cinco anos, usando como referência as cidades de Songdo, na Coreia do Sul, e de Masdar, nos Emirados Árabes Unidos.
Coletar dados ambientais, por meio de redes de sensores sem fio (RSSFs), não é prerrogativa somente das cidades high-tech, mas está cada vez mais inserido em ambientes e propósitos de larga escala, como o monitoramento das chamadas florestas inteligentes e de desastres naturais. No entanto, a relação custo e efetividade entre a entrega confiável de dados e o consumo de energia ainda é um problema nas RSSFs.
Valério Rosset, professor do ICT/Unifesp
Pensando nisso, Valério Rosset, professor do Instituto de Ciência e Tecnologia (ICT/Unifesp) – Campus São José dos Campos, e um grupo de pesquisadores criaram um novo protocolo de roteamento que, além de coletar os dados, opera a rede de forma autônoma, com custos de memória e de sobrecarga de comunicação muito baixas, retransmitindo os dados com maior precisão, mesmo em longas distâncias.
Além de Rosset, estão envolvidos no estudo Mariá Nascimento Rosset e Bruno Yuji Lino Kimura, professores pesquisadores associados do ICT/Unifesp, Matheus Antunes de Paulo e Tiago Viger Ortiz, estudantes de pós-graduação, e Rodrigo Francisquini e João Henrique de Araújo Morais, de graduação.
Inteligência das formigas
O novo protocolo, chamado CB-RACO, utiliza-se de roteamento bioinspirado, ou seja, busca resoluções de problemas criando algoritmos por meio de observações provenientes da Biologia. “O sonar, por exemplo, foi inspirado nos morcegos, o velcro, em plantas, e o nosso sistema, em uma técnica já conhecida como Otimização de Colônia de Formigas (ACO, do inglês Ant Colony Optimization Algorithm), que imita o comportamento desse inseto quando encontra uma fonte de alimento e faz com que seus pares sigam o mesmo percurso”, explica. “Dessa forma, as ‘formigas virtuais’ procuraram a solução de problemas computacionais por grafos”.
Rosset afirma que o CB-RACO cria comunidades (clusters) nas RSSFs e atende ao equilíbrio do consumo de energia por meio do roteamento de dados dentro de cada uma delas por meio da inteligência de enxame. “Uma das principais ideias desse protocolo é confinar as formigas nas comunidades”, explica. “Como consequência, exige baixa memória e sobrecarga na construção e manutenção de caminhos múltiplos de roteamento, além de alta confiabilidade de entrega das mensagens graças à estratégia de retransmissão de dados baseada em confirmação de recebimento entre comunidades, mesmo em redes de grande escala”.
Desempenho superior
Para avaliar o desempenho do protocolo sugerido, os pesquisadores desenvolveram um estudo em um ambiente simulado, utilizando o CB-RACO e um outro sistema genérico, intitulado somente RACO, que agrega as principais características dos sistemas encontrados na literatura.
No consumo de energia, o protocolo CB--RACO consumiu 37% menos energia que o genérico (RACO) ao entregar os dados para o mesmo destino. “O consumo é reduzido devido à busca de caminhos eficientes de roteamento realizada pelas formigas dentro das comunidades”, afirma Rosset.
Em relação à confiabilidade de entrega dos dados, apesar de a taxa de atraso de entrega de dados de ambos os protocolos aumentar paralelamente com a carga da rede sem fio, o CB-RACO apresentou valores maiores que o concorrente, especialmente nos cenários com maior carga de transmissão de dados. “A confiabilidade da entrega de dados em RSSFs, em larga escala, também se manteve em níveis considerados adequados”, conclui o pesquisador.
Exemplos de implantação de uma rede de sensores
Essas imagens são exemplos de implantação de uma Rede de Sensores em ambiente urbano contendo 200 dispositivos.
Na primeira imagem há uma simulação da rede como um todo, sem qualquer tipo de organização hierárquica dos dispositivos, ou seja, cada dispositivo é identificado por um identificador numérico.
Na segunda há uma simulação da organização da rede em comunidades feita pelo CB-RACO. Nesse caso, cada comunidade é identificada por um valor e cada sensor que pertence à comunidade é identificado, na figura, com o mesmo número, bem como a mesma cor.
Monitoramento de desastres
Outro projeto do ICT/Unifesp, que conta com a parceria do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) e foi submetido à Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) para custeio, inclui o desenvolvimento de uma plataforma de coleta de dados experimental e de baixo custo para monitoramento de desastres naturais.
Além do desenvolvimento do software específico - criado a partir de uma placa de código aberto – para atender aos requisitos do centro de gerenciamento, o grupo está trabalhando na criação de estações de monitoramento sem fio, com custo bem menor do que as oferecidas no mercado, com maior alcance e maior tempo de funcionamento, já que o projeto possibilita a inclusão de placa solar para alimentar e recarregar as baterias internas. “Cada estação conta com pluviômetro, GPS, medidor de pressão atmosférica e precisa estar integrada ao sistema”, explica Rosset. “Quando esses equipamentos quebram e novos precisam ser repostos pelos disponíveis no mercado, muitas vezes não são compatíveis com o sistema do centro de monitoramento, necessitando a implantação de novas soluções”.
De acordo com ele, o projeto em andamento pretende justamente resolver esse tipo de conflito. “Além de baratear o custo de cada estação, já que o Cemaden precisa de milhares delas, que estão espalhadas por todo o território nacional, ele a torna compatível com o sistema já existente adequável às necessidades dos profissionais do Cemaden, afirma o pesquisador. “Dessa forma, principalmente para as empresas públicas, que dependem de licitação para manutenção e troca de equipamentos, essa é uma solução rápida e mais viável”.
Além de pesquisadores do ICT/Unifesp e do Cemaden, também estão envolvidos no projeto professores do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação e da Escola de Engenharia de São Carlos, ambas da Universidade de São Paulo de São Carlos (USP/São Carlos), e do Instituto de Computação da Universidade Estadual de Campinas (IC/Unicamp).
Artigos relacionados:
ROSSET, Valério; PAULO, Matheus A. de; CESPEDES, Juliana Garcia; NASCIMENTO, Mariá C.V. Enhancing the reliability on data delivery and energy efficiency by combining swarm intelligence and community detection in large-scale WSNs. Expert Systems with Applications, v. 78, p. 89-102, 2017. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/313250407_Enhancing_the_Reliability_on_Data_Delivery_and_Energy_Efficiency_by_Combining_Swarm_Intelligence_and_Community_Detection_in_Large-scale_WSNs >. Acesso em: 03 maio 2017.
PAULO, Matheus A. de; NASCIMENTO, Mariá C. V.; ROSSET, Valério. Improving the connectivity of community detection-based hierarchical routing protocols in large-scale WSNs. Procedia Computer Science, v. 96, p. 521-530, 2016. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/307914211_Improving_the_Connectivity_of_Community_Detection-based_Hierarchical_Routing_Protocols_in_Large-scale_WSNs>. Acesso em: 03 maio 2017.
PAULO, Matheus A. de; NASCIMENTO, Mariá C. V.; ROSSET, Valério. RLP: a community detection-based routing protocol for wireless sensor networks. In: INTERNATIONAL SYMPOSIUM ON NETWORK COMPUTING AND APPLICATIONS, 13., 2014, Cambridge. Proceedings… Cambridge:IEEE, 2014. Disponível em: <http://ieeexplore.ieee.org/stamp/stamp.jsp?arnumber=6924233>. Acesso em: 03 maio 2017.