(Fotografia: Alex Reipert)
Texto: Matheus Campos
Do diagnóstico ao tratamento, como compreender os maiores anseios de um paciente acometido pelo câncer? Segundo a professora Edvane de Domenico, do Departamento de Enfermagem Clínica e Cirúrgica da Escola Paulista de Enfermagem (EPE/Unifesp) - Campus São Paulo, é fundamental enxergar o indivíduo de maneira holística. Nas dependências do hospital, cumpre torná-lo visível e dar atenção às suas necessidades, inclusive durante a espera pelo atendimento. Aos estudantes que orienta, ela diz que é preciso manter os “radares ligados” e entrever os pedidos de ajuda nos olhares e nos semblantes de cada paciente. É necessário acolher.
De acordo com o dicionário, o verbo acolher está relacionado a proteção, amparo e conforto. O acolhimento se dá pela forma com que alguém se mostra presente ao outro. Acolher é valorizar e considerar. Foi da essência desse conceito que surgiu o nome Acolhe-Onco, um programa de extensão universitária com ações educativas e assistenciais destinadas aos pacientes portadores de doenças oncológicas. O programa é coordenado pela docente e atende usuários do Sistema Único de Saúde (SUS).
Cuidado integral
Criado em 2008, a partir de uma iniciativa conjunta entre a EPE/Unifesp e o Departamento de Oncologia Clínica e Experimental da Escola Paulista de Medicina (EPM/Unifesp), o Acolhe-Onco é um serviço multiprofissional que contempla as áreas de Enfermagem, Medicina, Serviço Social, Farmácia, Nutrição, Fisioterapia, Psicologia e Odontologia, entre outras.
“O principal objetivo é melhorar a rede de atendimento oncológico de forma a oferecer uma infraestrutura que viabilize a possibilidade de o paciente ser cuidado dentro de suas necessidades múltiplas”, explica a coordenadora. Segundo ela, a aproximação com a pessoa atendida torna-se mais humanizada e não apenas técnica.
“É impactante a forma como você lida com o paciente e como ele lida com você – é uma troca”, ressalta Maria Eunice Carvalho, estudante do 3° ano de Enfermagem da EPE/Unifesp e monitora do Acolhe-Onco desde abril de 2019. A futura enfermeira relata que começou a perceber a vida e a graduação com outros olhos após a entrada no programa.
A equipe multiprofissional se dedica aos ambulatórios de Oncologia Geral e de Onco-Hematologia do Hospital São Paulo, nos quais são atendidos, em média, 40 pacientes por dia. “Claro que nem todas as pessoas acolhidas são vistas por profissionais de todas as áreas. Por exemplo, se um paciente passa por uma consulta médica e precisa de cuidados que competem a um enfermeiro, receberá – na sequência – as orientações da enfermagem; nos casos cuja demanda é relacionada à nutrição, poderá ser encaminhado diretamente aos nutricionistas”, esclarece a docente.
Além da coparticipação no programa de residência multiprofissional em Oncologia, o Acolhe-Onco possui parcerias técnico-científicas com o A. C. Camargo Cancer Center e o Hospital Amaral Carvalho, situados respectivamente nas cidades de São Paulo e Jaú, em São Paulo. O intuito dessas colaborações é fortalecer a produção técnico-científica com o compromisso de aprimorar a qualidade da assistência em saúde.
Equipe do Acolhe-Onco realiza atendimento social e efetua curativo em paciente com câncer (Fotografia: Alex Reipert)
A docente Edvane de Domenico e demais membros do Acolhe-Onco atuam na supervisão das ações assistenciais (Fotografia: Alex Reipert)
Vulnerabilidade social
A maioria dos pacientes com câncer atendidos pelo SUS faz parte de uma realidade em que se evidenciam vulnerabilidades sociais. No geral, são indivíduos pertencentes a classes econômicas menos favorecidas, moradores de áreas geográficas periféricas ou municípios próximos. Trata-se de uma população em desvantagem econômica, educacional, cultural e ambiental. O Acolhe-Onco auxilia no serviço prestado a muitos pacientes nessas condições, os quais já apresentavam a doença em estágio avançado no momento do diagnóstico e com baixos índices de sobrevida em cinco anos.
“Apesar das fragilidades, essa população é ávida por conhecimentos na área da saúde; então, ela não pode ter a capacidade minimizada no entendimento do processo saúde-doença”, destaca Domenico. Para esta, os pacientes, os cuidadores e os familiares apropriam-se de habilidades e de conhecimentos se forem adequadamente avaliados, orientados e acompanhados no processo de adoecimento pelo câncer.
Em busca do melhor
O programa de extensão organiza reuniões mensais (em média, com 25 participantes) que agregam os diferentes profissionais e alunos envolvidos. Trata-se de um momento importante para o crescimento científico e para o monitoramento das necessidades e do padrão de qualidade do programa.
“Sempre tive medo da área de Oncologia por achar que nela ocorreriam mortes frequentes, mas, ao invés de tristeza, eu vi muita luz, muita vida”, enaltece Ricardo Matheus, estudante do quarto ano de Enfermagem da EPE/Unifesp. Em consonância com o grupo, reconhece o quão gratificante é o crescimento pessoal, profissional e estudantil ao participar do Acolhe-Onco. Quando define sua experiência com os atendimentos, cita Carl Jung: “Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas, ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana”.
Serviços prestados
Acolhimento integral- Atendimento individualizado
- Aconselhamento telefônico: contato direto por meio de ligações ou mensagens (em média, 120 solicitações por mês), garantindo segurança ao paciente, manejo de sinais e sintomas, educação e apoio para a adesão terapêutica
- Impressos e vídeos educativos: informações importantes e orientações sobre o tratamento para os pacientes e seus familiares
Neste e no próximo ano, o Acolhe-Onco adotará a cartilha We can, I can, proposta pela Union for International Cancer Control (UICC) no biênio 2016-2018. Nessa organização não governamental, sediada na Suíça, diferentes temas são abordados para conscientizar profissionais da saúde, educadores, pacientes e o público em geral sobre prevenção, detecção precoce, esclarecimento de direitos e aprimoramento da assistência integral relativos ao câncer.