Impacto da covid-19 na percepção ambiental

Estudo avaliará impacto da covid-19 na percepção ambiental e de risco em indivíduos com poder de decisão em empresas

percepção ambiental por Freepik

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Daniel Patini

Para além das questões de saúde, as consequências trazidas pela pandemia do novo coronavírus suscitam outros debates, como a relação entre o ser humano e o meio ambiente. Por essa razão, Monique Tayla Ferreira desenvolve sua dissertação de mestrado, intitulada Pandemia em Tempos de Antropoceno: um estudo de avaliação do impacto da covid-19 na percepção ambiental e percepção de risco em indivíduos com poder de decisão em empresas, no Programa de Pós-Graduação em Análise Ambiental Integrada do Instituto de Ciências Ambientais, Químicas e Farmacêuticas (ICAQF/Unifesp) - Campus Diadema, sob a orientação de Luciana Farias e Cristina Nakayama.

Como explicam as pesquisadoras, o antropoceno corresponde ao início de uma nova época geológica, na qual o ser humano passou a promover uma grande transformação no planeta Terra, modificando os ciclos biogeoquímicos globais. O termo foi formulado pelo químico holandês Paul Crutzen, que recebeu o Prêmio Nobel de Química em 1995. “Um dos exemplos mais marcantes dessa interferência é a nossa contribuição para a intensificação das mudanças climáticas em função do modo de vida e a organização das sociedades, que levam ao uso exacerbado de recursos naturais, à geração de gases de efeito estufa e a alterações nos usos da terra. Essas interferências provocam ainda a perda de espécies e favorecem o surgimento e a disseminação de doenças e pandemias, como a covid-19”, exemplifica Nakayama.

O trabalho avaliará se a pandemia influenciou ou não a percepção ambiental de 50 profissionais ativos(as) no mercado de trabalho e que exercem cargos de liderança de equipes em diversas empresas, correlacionando com a percepção de risco em relação a desastres ambientais futuros e o desenvolvimento de uma maior responsabilidade socioambiental. Haverá contato prévio com os(as) possíveis participantes pré-selecionados(as) por meio do LinkedIn, uma rede social empresarial, e de associação de indústrias, por exemplo. “Líderes de grandes empresas possuem poder de decisão, que é um fator determinante no investimento ou incentivo por ações que envolvam maior responsabilidade socioambiental. Diante da demanda urgente por ações mais comprometidas com os objetivos do desenvolvimento sustentável (ODSs), é uma ótima oportunidade de trabalhar a educação ambiental nesse segmento, que muitas vezes não é atendido em projetos e programas”, relata a estudante sobre o motivo da escolha do público-alvo.

O questionário on-line, para aplicação futura, terá 36 perguntas e será dividido em blocos temáticos que permitirão reunir informações sobre a percepção de risco em relação ao novo coronavírus e à percepção ambiental dos(as) participantes, tanto no aspecto individual quanto no contexto do trabalho. A partir dos ramos de atuação presentes na pesquisa, pretende-se realizar também uma análise documental em dados oficiais divulgados por organismos nacionais e internacionais, em veículos de comunicação e em informações veiculadas por ONGs e associações da sociedade civil, bem como na literatura científica.

Assim, a intenção será investigar quais setores têm sido mais e menos atuantes na adaptação dos ciclos de vida dos produtos para que sejam mais sustentáveis, e se isso já era uma prática da empresa antes da pandemia. O prazo previsto para finalização da pesquisa é janeiro de 2023. Os resultados obtidos pelo estudo ajudarão na elaboração de estratégias e ações mais adequadas de educação ambiental a serem trabalhadas com o público-alvo, para que “alcancem diferentes dimensões do ser humano para além dos aspectos cognitivos, racionais e econômicos e sejam efetivos em sensibilizar esse público para incorporar práticas mais sustentáveis no ambiente corporativo”, relata Farias.

Gerente comercial de um grupo bancário brasileiro há sete anos, Renato Pereira lidera um time de 13 pessoas. Ele diz que a companhia tem adotado medidas sustentáveis em suas agências e escritórios, os quais possuem coleta seletiva de resíduos, economia de energia e de recursos hídricos e redução no consumo de produtos descartáveis. Atualmente, devido às medidas de isolamento social para conter o vírus, parte da organização mantém-se em trabalho remoto, mas, ainda assim, ele percebe uma preocupação em manter a cultura de conscientização ambiental mesmo no ambiente doméstico. “A pressão do dia a dia e a cobrança por metas não podem ser desculpas para deixarmos de lado questões tão importantes como a sustentabilidade”, justifica.

De acordo com Farias, os indivíduos só se veem, de fato, pressionados a se envolverem em questões ambientais quando algo interfere diretamente em suas vidas e eleva sua percepção de risco, seja uma catástrofe natural com perdas econômicas ou a perda de uma pessoa próxima por algum evento climático. “Quando sentimos a fragilidade da nossa espécie, somos forçados(as) a refletir a respeito da nossa dependência do todo, do equilíbrio ecossistêmico e climático. Nesse momento, uma educação ambiental efetiva pode favorecer uma ressignificação da nossa visão de meio ambiente, mudando de uma representação mais antropocêntrica e utilitarista para uma globalizante, na qual não há uma relação de dominância do ser humano e da sociedade sobre a natureza, mas sim uma consciência de interdependência entre ambos”, comenta a docente.

Ferreira acredita que a responsabilidade para o desenvolvimento de uma consciência socioambiental é da sociedade como um todo, incluindo as empresas, as quais, em geral, têm uma postura mais reativa às regulações e demandas do mercado por métodos e produtos ambientalmente responsáveis. “Todavia, elas poderiam contribuir mais significativamente se pudessem se antecipar, assumindo o protagonismo na busca por processos mais coerentes com os limites dos recursos naturais e ecossistemas do planeta e valorizar a oferta de produtos gerados com maior responsabilidade socioambiental”, conclui.

 

Monique Tayla

Luciana Farias

CRISTINA ROSSI NAKAYAMA

Pesquisa de mestrado de Monique Tayla Ferreira (à esq.), orientada por Luciana Farias (centro) e Cristina Nakayama (à dir.), avaliará impacto da pandemia na percepção ambiental e de risco em profissionais que exercem cargos de liderança em empresas