Por Matheus Campos
Uma recente pesquisa intercampi da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), intitulada Desigualdades e Vulnerabilidades na Epidemia de Covid-19: Monitoramento, Análise e Recomendações, teve como um dos objetivos aprofundar o olhar sobre o acesso aos alimentos e o impacto da pandemia na qualidade da dieta. Diante disso, dentre os 16 territórios vulneráveis analisados, foi escolhido, para a realização do inquérito nutricional, a comunidade Vila São José, localizada no Distrito de Capela do Socorro, Subdistrito de Cidade Dutra, no extremo da zona sul de São Paulo.
De acordo com o Índice Paulista de Vulnerabilidade Social (IPVS), o subdistrito de Cidade Dutra localiza-se na escala de média, alta e muita alta vulnerabilidade, o que indica a presença de famílias que agregam baixos níveis de renda familiar, chefes de família poucos escolarizados e maior presença de crianças e adolescentes. A maioria das crianças e jovens que vivem na Vila São José está incluída no IPVS 5 e 6, que se referem à dimensão socioeconômica baixa, ciclo de vida familiar de famílias jovens. Na Vila São José, as escolas têm carências em sua infraestrutura e de acesso, e os projetos complementares às políticas públicas não são suficientes.
O objetivo do inquérito foi avaliar, em outubro e novembro de 2020, o acesso aos alimentos utilizando a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar e Nutricional, EBIA, 235 na versão curta. O EBIA é composto por cinco questões referentes à percepção do chefe de família quanto à: a) preocupação de que os alimentos pudessem faltar antes de comprar ou ganhar mais alimentos; b) falta de alimento antes de ganhar ou comprar mais alimentos; c) redução do número de refeições; d) redução na quantidade; e) piora na qualidade das refeições.
Além do EBIA, foi aplicado o questionário de frequência alimentar sobre consumo na semana anterior de frutas, verduras e legumes, arroz e macarrão integral ou granola, embutidos, congelados e pizza, salgadinhos e doces industrializados.
Dados
Este questionário foi aplicado de forma on-line em novembro de 2020. No total, 329 chefes de família responderam. A maioria se considera como pardo ou preto, 96% dos domicílios tem moradores menor de 18 anos e 47% encontra-se em insegurança alimentar e nutricional moderada e grave. 79% vivenciaram preocupação de que pudesse faltar alimento antes de comprar ou receber, 18% dos domicílios tiveram a falta de alimentos, 62% reportaram ter consumido menor quantidade do que gostaria, 47% não considera a alimentação da sua família saudável e variada e 31% realizam apenas duas ou menos refeições principais ao dia.
Segundo a classificação do questionário, 5% das famílias apresentaram fome, 57% reportaram não ter consumido fruta ou apenas um dia na semana e metade não consumiu ou comeu apenas um dia na semana verduras e legumes.
Desta forma, foi levantado que metade da população avaliada apresenta-se em situação de insegurança alimentar e nutricional com comprometimento na qualidade da refeição. “A fome volta a ser uma agenda forte que acentua a vulnerabilidade. Esta grave situação nutricional encontrada ressalta a urgência de políticas públicas sociais para enfrentar esta situação extremamente grave encontrada na pesquisa”, destaca a professora Luciana Tomita, responsável pela realização do inquérito.