Estudo aprofunda o debate sobre saúde mental e exclusão social e destaca a importância de políticas públicas voltadas para a saúde mental em comunidades socialmente vulneráveis
Por Ligia Gabrielli
(Imagem Ilustrativa)
A crescente desigualdade social no Brasil tem impactado de modo alarmante a saúde mental da população, especialmente entre os(as) mais vulneráveis. Um estudo liderado pelo pesquisador Fernando Malinowski, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), e publicado na revista científica Nature Cities, apresenta uma análise detalhada sobre como a exclusão social pode agravar transtornos psicóticos, como a esquizofrenia, em favelas na cidade de São Paulo.
Sob a orientação do professor Ary Gadelha, da Escola Paulista de Medicina (EPM/Unifesp) - Campus São Paulo, Malinowski e sua equipe investigaram as dinâmicas sociais que influenciam a saúde mental nas favelas brasileiras. O artigo, fruto de um longo período de pesquisa e análise, revela que a exclusão social está associada a sintomas mais graves em quadros psicóticos, exacerbando o ciclo de marginalização e sofrimento.
"Um entendimento importante derivado dos nossos achados é o de que uma população excluída socialmente parece sofrer de uma forma mais grave de esquizofrenia quando a doença surge, ampliando as adversidades vivenciadas por um grupo de pessoas já vulnerável", explica Malinowski. Este fenômeno, embora observado na prática clínica, nunca havia sido abordado de maneira tão detalhada na literatura científica, o que torna o estudo pioneiro em seu campo.
A pesquisa sugere que a gravidade dos transtornos psicóticos em populações marginalizadas não pode ser totalmente explicada por fatores como renda, escolaridade ou raça, indicando que a exclusão social tem um impacto ainda mais profundo na saúde mental do que se supunha anteriormente. "O problema não é morar na favela em si, mas sim o que lá acontece e as interações desses lugares com a sociedade", afirma Malinowski. Ele destaca que a violência, a falta de infraestrutura e o acesso limitado a serviços básicos potencialmente agravam os problemas de saúde mental, criando um ambiente propício para o desenvolvimento de transtornos mais severos.
As conclusões do estudo reforçam a necessidade urgente de políticas públicas que abordem a saúde mental de maneira integrada e específica para essas populações. "Passa a ser fundamental elaborar estratégias de assistência em saúde mental específicas para assistir essa população", sugere o pesquisador. Entre as propostas estão a ampliação da oferta de cuidados em saúde mental nas comunidades socialmente excluídas, parcerias entre atenção especializada e atenção primária, e o uso da capilaridade dos serviços primários para a detecção precoce de transtornos psicóticos.
O estudo também aponta para a importância de compreender melhor as dinâmicas sociais dentro das favelas e como elas influenciam a saúde mental de seus moradores. "Tentamos isolar questões relacionadas à renda, escolaridade e raça, e ainda assim encontramos resultados estatisticamente significativos", relata Malinowski. Isso sugere que as intervenções devem ir além do âmbito econômico, abordando as complexas dinâmicas sociais que contribuem para o agravamento da saúde mental nessas áreas.
A publicação do estudo na Nature Cities é um marco importante para a comunidade científica e, também, para a sociedade como um todo. Ela traz à tona a necessidade de um olhar mais atento e humano para as questões de saúde mental em contextos de exclusão social, reforçando a urgência de intervenções políticas e sociais que promovam equidade e justiça social.
Além de contribuir para a literatura científica, o trabalho de Malinowski e do professor Ary Gadelha abre um importante espaço de debate sobre como podemos melhorar o acesso a cuidados de saúde mental para as populações mais vulneráveis. Esse debate, que agora ganha destaque internacional, é essencial para construir uma sociedade mais justa e equitativa, onde todos tenham a oportunidade de viver com dignidade e saúde.