Apresentação do Coral Nhanderu Rembiguai, da Aldeia Paranapuã
No dia 14 de março, foi realizada, no Campus Baixada Santista, a cerimônia de boas-vindas à 1.ª turma do curso de Licenciatura Intercultural Indígena (Lindi) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), iniciativa pioneira no Estado de São Paulo. A Lindi conta com um Conselho Político e é coordenada pela professora Valéria Macedo e vice-coordenada pelo professor Vinicius Demarchi Silva Terra, responsável pelo cerimonial do evento, que foi aberto com a apresentação do Coral Nhanderu Rembiguai, da Aldeia Paranapuã, do município de São Vicente/SP.
O curso, que oferece 40 vagas anualmente, foi criado para contribuir com a efetivação dos direitos indígenas à educação diferenciada, intercultural, bilíngue e comunitária, por meio da formação de educadores(as) indígenas que já atuam nas escolas de suas aldeias, no Estado de São Paulo, e que ainda não tiveram a oportunidade de acessar o ensino superior. É voltado para atuação prioritária na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental.
Estavam presentes na mesa de abertura: a reitora da Unifesp, Raiane Assumpção, a coordenadora-geral de Educação Escolar Indígena da Secadi/MEC, Rosilene Cruz de Araújo Tuxá; o coordenador da Funai no litoral sudeste, Ubiratan Gomes; o procurador do Ministério Público Federal, Steven Shuniti Zwicker; o coordenador do Comitê Interaldeias do litoral, Edmilson de Souza Karai; representando os membros do Conselho Político da Lindi, Sérgio Popygua; o diretor acadêmico do Campus Baixada Santista, Odair Aguiar Junior; o diretor do Instituto Saúde e Sociedade (ISS/Unifesp), Fernando Kinker; o representante acadêmico discente Manoel Pereira Caixeta; a pró-reitora de Graduação, Ana Gouw; a pró-reitora de Extensão e Cultura, Débora Galvani; e a coordenadora da Lindi, Valéria Macedo.
Emocionada, a reitora agradeceu, em nome da professora Valéria, o empenho de todos(as) envolvidos(as) no processo de construção dessa licenciatura. Ela destacou que o momento, resultado de um trabalho de muitos anos, marca um passo muito importante da universidade. “Ter um curso como esse demonstra que a instituição, nesses últimos 30 anos, deu um passo fundamental no sentido do que é, de fato, uma universidade, aquilo que nos dá unidade e, ao mesmo tempo, nos garante o que é específico de cada lugar, que é a diversidade. Trata-se de um marco institucional do que a nossa universidade assumiu como concepção de educação”, ressaltou.
"A Lindi é um marco institucional para nossa universidade", ressaltou a reitora
Para a coordenadora-geral de Educação Escolar Indígena da Secadi/MEC, Rosilene Cruz de Araújo Tuxá, que também é egressa e professora de uma licenciatura intercultural, a educação escolar indígena ainda tem o pior índice da educação brasileira, por que não há acesso a cursos de licenciaturas e pedagogias interculturais para a formação de professores(as). "Um curso como esse ainda é um sonho para muitos de nós. E, nesse sentido, parabenizo a Reitoria e a universidade, e que a gente possa, de fato, institucionalizar esse curso para garantir o fluxo contínuo de ingresso de indígenas na universidade", disse.
Ubiratan Gomes, coordenador da Funai no litoral sudeste, falou que a criação da Lindi "não se trata de um privilégio o que Estado está fazendo para nós, mas, sim, de uma reparação histórica de tudo que foi feito referente à integração forçada de nossos povos, apagamento de memórias de nossos ancestrais. Enquanto liderança indígena, gostaria de desejar muito força para aqueles que estão começando agora esse curso e dizer que o trajeto não vai ser fácil, mas, em nome de todos aqueles que lutaram, nós temos que continuar. Estamos juntos nessa caminhada".
O procurador do Ministério Público Federal, Steven Shuniti Zwicker, relembrou alguns passos da caminhada de vários anos até a efetivação desse curso. Segundo ele, "a ideia de uma licenciatura indígena no estado já estava fermentando desde o momento que as comunidades indígenas começaram a receber educação escolar e a perceber o quanto era importante que as próprias comunidades se apropriassem desse processo de ensino, e que os professores fossem indígenas. Os grandes heróis dessa história são as comunidades indígenas que não deixaram a bola cair em momento algum".
Sérgio Popygua, um dos membros do Conselho Político da Lindi, agradeceu pela oportunidade de poder presenciar a inauguração dessa primeira turma, que “é resultado da soma de esforços e um momento muito importante para a gente e para o futuro. As crianças das aldeias estão ansiosas para aprender coisas novas, aprender que a nossa cultura é importante. Mesmo estando na faculdade, nós seremos sempre indígenas. Só estamos fazendo parte de onde nós também temos o direito de estar”. Já o diretor acadêmico do Campus Baixada Santista, Odair Aguiar Junior, lembrou com satisfação que o campus completa duas décadas em 2024. “A gente não poderia comemorar da melhor forma, com a abertura da Licenciatura Intercultural Indígena, que vem coroar esses 20 anos, juntamente com o curso de Oceanografia”.
A pró-reitora da Graduação, Ana Gouw, parabenizou e deu boas-vindas aos(às) 40 estudantes da turma, que chegam em um momento de festa. "É realmente um momento especial, pois a chegada de vocês vem em um momento auspicioso da Unifesp: são 20 anos do Campus Baixada Santista e 30 anos da Unifesp. A presença de vocês vai transformar a Unifesp em uma universidade muito melhor", celebrou. Para a pró-reitora de Extensão e Cultura, Débora Galvani, “o momento é de comemoração e também de renovação da luta, pois esse curso precisa ter vida longa, com muitos anos e muitas turmas. De fato, a expectativa é de transformação da universidade. Quero reafirmar aqui o nosso compromisso de continuarmos batalhando e defendendo a educação intercultural indígena e uma universidade cada vez mais plural”.
A coordenadora da Lindi, professora Valéria Macedo
“É uma honra ter esses educadores indígenas como nossos alunos. Quero muito agradecer aos povos e professores indígenas do Estado de São Paulo pela confiança, que esperamos honrá-la. Dentro desse cenário das universidades públicas do estado, a Unifesp está comprometida em construir um lugar de muito diálogo com os movimentos sociais e de muita abertura a sujeitos que vão poder trazer conhecimentos múltiplos de um mundo múltiplo. Espero que a diferença não seja um problema a ser superado, mas seja a solução para estarmos sempre desestabilizando as nossas certezas e construindo conhecimento, nos transformando e construindo um mundo melhor. O conhecimento apartado do mundo, das lutas e dessa busca por transformação não faz sentido", finalizou a coordenadora da Lindi, Valéria Macedo, acompanhada pelo corpo docente do curso, fortemente aplaudido pelo público.
Mesa de aconselhamento com educadores(as) indígenas e membros da Bateria Repicapau
Após a abertura do encontro, foi formada uma mesa de aconselhamento com professores(as) indígenas, composta por Cristine Takuá, Zélia Luiz Terena e Saulo Ramires Kuaray Xunu, que conversaram com o público. A cerimônia de boas-vindas foi encerrada com a apresentação da Bateria Repicapau, do Campus Baixada Santista da Unifesp.
Os(As) primeiros(as) alunos(as)
Uma das estudantes da primeira turma da Lindi é Kerexu Mirin da Silva, da Terra Indígena Tenondé Porã. Professora do ensino fundamental I há quase 10 anos, ela sempre ouvia falar desses cursos interculturais em outros estados, mas era difícil sair da aldeia. “O curso era bastante esperado mesmo, e eu participei do processo de criação da Lindi. Estou muito contente, porque nas primeiras aulas a gente já aprendeu muita coisa. Como estudante do ensino médio, não tínhamos essas informações que estamos tendo agora, como legislações e direitos. Estando na base, não tínhamos essa visão. Esse curso está sendo muito importante para a luta da educação escolar indígena”, garantiu.
Kereku e David integram a primeira turma da Lindi
Outro estudante é David Vera Popygua Ju, da terra indígena do Jaraguá. De acordo com ele, que é professor da rede estadual indígena desde 2008, a luta para conseguir essa formação específica para os(as) professores(as) indígenas do estado de São Paulo vem de muito tempo. “Agora, é hora de aprender mais e trazer os conhecimentos da nossa experiência, do nosso povo tão diverso. É fundamental para educação escolar indígena que aconteçam essas licenciaturas pelo Brasil, pois é uma educação muito específica, bilíngue. A licenciatura indígena traz como diferencial poder trabalhar com os povos indígenas conteúdos e temas específicos. Ela é fundamental para que a educação indígena seja respeitada de fato no Brasil”, concluiu.
Mario Karai Moreira entrega à reitora uma flecha, símbolo da resistência indígena
Demais presentes
Também estiveram na cerimônia Georgia Mansour, pró-reitora de Administração; Isabel Quadros, assessora de Relações Acadêmicas e Institucionais do Gabinete da Reitoria; Anderson Rosa, pró-reitor de Assuntos Estudantis e Políticas Afirmativas; Maria Liduína de Oliveira e Silva, pró-reitora adjunta de Graduação; Murillo Giordan Santos, procurador-chefe da Unifesp; Simone Avancini, gerente do Sesc Santos; Olga Maurício Mendonça, vice-diretora do Monumento Nacional Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos – Base Avançada de Pesquisa, Cultura e Extensão da USP; representantes da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo; entre outros(as).
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Fotos: Alex Reipert