Segunda, 06 Novembro 2017 13:27

Opinião: Ampliando as percepções do cosmo com a astronomia gravitacional

Por Nadja Simão Magalhães*

Neste ano, o prêmio Nobel de Física foi destinado a três cientistas que dedicaram boa parte de suas carreiras ao estudo de um sutil fenômeno: as ondas gravitacionais. Voltando no tempo uns 30 anos, quando eu buscava um projeto para meu doutorado, me foi proposto um tema inesperado: a detecção de ondas gravitacionais. Logo aceitei porque gravitação me fascinava, mas o assunto era obscuro até para outros físicos. Já naquela época se tentava detectar ondas gravitacionais há umas três décadas, sem sucesso. Havia poucos grupos, pequenos e com verbas limitadas.

Um século atrás, quando Einstein lançou sua teoria da gravitação – a relatividade geral –, ele propôs que a gravidade seria mais ou menos como um tecido, de espaço interligado com o tempo, o espaço-tempo. Em tese, explosões ou colisões de grandes astros perturbariam o espaço-tempo de tal forma que, ao longe, essas perturbações seriam percebidas como tênues ondas, como quando se joga uma pedra em um lago.

Os debates teóricos sobre a existência real dessas ondas se estenderam por décadas. Somente nos anos 1960, os primeiros detectores foram construídos, enfrentando imensos desafios tecnológicos. Havia também desafios teóricos, como o de entender as fontes celestes que gerariam as ondas.

A primeira pista de que as ondas gravitacionais existiriam veio com a observação de um sistema binário cujo período orbital estava diminuindo na mesma proporção em que estaria emitindo ondas gravitacionais. Após 20 anos de observação, os pesquisadores, em 1993, receberam o prêmio Nobel de Física por essa descoberta.

Somente em 2016 é que, enfim, a equipe de mais de mil cientistas da colaboração internacional que envolve os detectores LIGO anunciou as primeiras detecções de ondas gravitacionais da história da humanidade. O feito foi tão extraordinário que gerou entusiasmo mas também ceticismo. Mesmo assim, a equipe logo começou a receber prêmios e outras expressões de reconhecimento.

No mês passado, a equipe divulgou a primeira detecção multimensageira de ondas gravitacionais em conjunto com observatórios astronômicos convencionais. Com ela foi possível testemunhar, pela primeira vez e em primeira mão, o colapso de um sistema binário de estrelas de nêutrons.

Outro dia, assisti a um vídeo sobre uma menina de 10 anos que escutava pela primeira vez. Foi tocante vê-la dar um pulo na cadeira enquanto ouvia a própria respiração para, em seguida, rir e depois chorar de emoção. É mais ou menos isso o que a humanidade está vivenciando com as primeiras detecções de ondas gravitacionais, especialmente a multimensageira. Através de observatórios gravitacionais, estamos ampliando os sentidos científicos para poder captar novos dados do universo, percebendo fenômenos jamais observados.

É um privilégio poder viver este momento pioneiro da história.

*Professora de Física e Matemática do Instituto de Ciências Ambientais, Químicas e Farmacêuticas – Campus Diadema da Unifesp e pesquisadora em análise de sinais, astrofísica e ondas gravitacionais.

As opiniões expressas no artigo não representam a posição oficial da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

 

Lido 10016 vezes Última modificação em Quarta, 17 Outubro 2018 21:56

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