Por Aline Salgado/ABC
Mesa de abertura da cerimônia (crédito da foto: https://www.facebook.com/abciencias/)
A Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) foi palco da cerimônia de diplomação dos novos membros afiliados da Academia Brasileira de Ciências (ABC). Cinco jovens pesquisadores tomaram posse e apresentaram suas pesquisas na quarta-feira, 28 de março, no Anfiteatro Leitão da Cunha, na Escola Paulista de Medicina. Na plateia, um público formado por membros da ABC, professores e alunos da Unifesp, além de familiares dos diplomados e autoridades, ouviu discursos emocionados em defesa da ciência brasileira.
Ederson Moreira dos Santos (USP, Ciências Matemáticas), Marcelo Alves da Silva Mori (Unicamp, Ciências Biomédicas), Marcelo Andrade de Lima (Unifesp, Ciências Biológicas) e Thiago Regis Longo Cesar da Paixão (USP, Ciências Químicas) foram os quatro jovens afiliados que tomaram posse como membros afiliados para o período de 2018 a 2022. Também eleito, Rafael Vasconcelos Ribeiro (Unicamp, Ciências Agrárias) não pôde comparecer e será diplomado na cerimônia de 2019. Já o eleito no ano passado para o intervalo de 2017 a 2021, Gustavo Martini Dalpian (UFABC, Ciências Físicas) foi diplomado com o grupo de 2018.
A abertura da cerimônia contou com discursos do vice-reitor da Unifesp, Nelson Sass; o pró-reitor adjunto de Pós-Graduação e Pesquisa da Unifesp, Ruy Ribeiro de Campos Jr.; o vice-presidente da Regional São Paulo da ABC, Oswaldo Luiz Alves ; o presidente da Academia, Luiz Davidovich; e a professora da Unifesp e presidente de honra da SBPC, a acadêmica Helena Bonciani Nader. O assessor especial da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), o acadêmico Hernan Chaimovich, e o também acadêmico Marcio de Castro Silva Filho, pró-reitor adjunto de graduação da USP, também participaram do evento.
Os novos afiliados da ABC também foram prestigiados pelo vice-reitor pro tempore da UFABC, Dácio Roberto Matheus; o pró-reitor de pesquisa da Unesp, Carlos Frederico de Oliveira Graeff; o pró-reitor de pesquisa da Unicamp, Munir Salomão Skaf; e a diretora da Escola Paulista de Medicina da Unifesp, Emilia Inoue Sato.
Representando a reitora da Unifesp, Soraya Soubhi Smaili, que não pôde comparecer à cerimônia em função da realização do Conselho Universitário da instituição na mesma data, o vice-reitor, Nelson Sass, ressaltou a escolha da ABC em realizar o evento na universidade. "É uma honra ter a presença da Academia nesta universidade, que revela não só um engrandecimento da Unifesp como a construção de uma rede preciosa de contato", disse Sass.
O vice-reitor afirmou também ser "muito auspicioso" saber que a Unifesp está representada na diplomação. "Junto com as demais universidades públicas, a Unifesp está inserida numa grande rede de pesquisa. A maior do continente. E isso precisa ser destacado", frisou Sass, que salientou ainda a luta e todo o desafio que os institutos de ensino e pesquisa vêm enfrentando com o corte e contingenciamento de recursos realizados nos últimos anos.
"Na presença da professora Helena Nader, preciso ressaltar o mérito e a inquietude dos cientistas brasileiros. Pessoas e instituições que, apesar de todas as dificuldades, conseguem manter pesquisas de alto nível, que visam alavancar a qualidade de vida de toda a população", acrescentou.
Novos membros afiliados da ABC - Regional SP (crédito da foto: https://www.facebook.com/abciencias/)
Já o pró-reitor adjunto de Pós-Graduação e Pesquisa da Unifesp, Ruy Ribeiro de Campos Jr., transmitiu mensagem do pró-reitor de Pós-Graduação e Pesquisa da Unifesp, o acadêmico Esper Abrão Cavalheiro . Acometido por uma gripe, Cavalheiro não pôde participar do evento, mas fez questão de parabenizar a todos os novos afiliados da ABC e agradecer à Academia por ter escolhido a Unifesp como local para a cerimônia.
Em sua fala, Ruy Ribeiro de Campos Jr. ressaltou os momentos de tensão que a produção científica brasileira vive. "Temos neste momento estudantes, na reitoria, fazendo protestos contra o corte sistemático de verbas na universidade", disse Campos Jr. "É preciso lembrar que São Paulo é hoje uma Holanda em termos de capacidade de gerar conhecimento. Somos maduros e temos condições de lidar com as adversidades. E uma das ações é agindo de forma política. Nenhum país vai conseguir estar na ponta sem investir em pesquisa", defendeu o pró-reitor.
O vice-presidente Oswaldo Luiz Alves fez coro à fala de Campos Jr. "Temos a convicção de que a retomada do conhecimento brasileiro e sua sustentação vão depender de quadros científicos de qualidade, que precisam ser financiados. Esse sentimento estimula a Academia Brasileira de Ciências a promover a entrada de novos membros, escolhidos todo o ano e em cada regional da ABC", afirmou Alves.
As ações que a ABC tem promovido em parceria com a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) para impedir o desmantelamento de laboratório Brasil afora foram lembradas pelo presidente Luiz Davidovich. "Assistimos, desde 2014, a cortes que vêm tomando volumes maiores. O orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) na área de custeio e capital chegou à ordem de R$ 4 bilhões, é 40% do orçamento de 2010 corrigido pela inflação. Sem contar o risco de termos novos contingenciamentos. e os R$ 700 milhões em recursos que são para a área de Comunicações", destacou Davidovich.
"Se a defesa da C,T&I é um dever da ABC, a ciência é sua paixão. Acreditamos que os novos jovens vão segurar a bandeira da defesa da ciência, para o bem da sociedade brasileira e do futuro do país", afirmou o presidente da ABC, que sugeriu ainda que a importância da C,T&I para o desenvolvimento de um país vire disciplina para os economistas na graduação.
"O que vivemos hoje é uma política econômica fora de moda, que não reconhece o papel da ciência e tecnologia como fundamental para o desenvolvimento econômico do país", criticou Davidovich. Ele relatou que a ABC, ao longo de sua história, de quase 102 anos, tem construído projetos com propostas reais de políticas públicas que visam preparar o Brasil para os desafios do presente e do futuro.
"As propostas estão à disposição de políticos e governantes. E não faltam sugestões. Agora em 2018, ano de eleições, os candidatos à Presidência da República receberão um documento com contribuições", disse. "O pís precisa de uma revolução na educação, o setor industrial necessita que haja a agregação de valor à produção e à exportação, e a bioeconomia e a conservação da biodiversidade são agendas que precisam ser pensadas", acrescentou Davidovich.
O presidente da ABC também falou sobre o desafio de levar os pesquisadores brasileiros para dentro das empresas. De acordo com Davidovich, eles hoje estão concentrados no Ensino Superior. "Diferente do que acontece nos Estados Unidos, Coreia do Sul e China, no Brasil nós não estamos colocando pesquisadores em empresas. Ao mesmo tempo, a participação de recursos de empresas para a pesquisa e desenvolvimento também é pequena. Precisamos mudar isso", afirmou.
Para Davidovich, embora a agricultura brasileira tenha ciência de ponta, é arriscado para o Brasil ter sua economia baseada em uma monocultura de exportação. "Precisamos de uma agenda de prospecção para o país com vista a tornar o Brasil competitivo frente às novas fronteiras tecnológicas e de pesquisa. No Congresso norte-americano, a pressão para aumentar recursos de pesquisa foi suprapartidária. Precisamos disso", defendeu.
Hernan Chaimovich, Luiz Davidovich, Oswaldo Luiz Alves, Ruy Ribeiro de Campos Júnior e Helena Nader (crédito da foto: https://www.facebook.com/abciencias/)
Professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) e referência mundial em mudanças climáticas, o acadêmico Paulo Eduardo Artaxo Netto também falou aos diplomados na cerimônia de posse. Artaxo fez um convite ao público a refletir sobre os impactos do crescimento econômico e social não sustentável, que leva a riscos em escala global. "Se olharmos todas as tendências socioeconômicas brasileiras, vemos que tudo está crescendo exponencialmente. Vemos que isso não é sustentável no curto e longo prazo. A pergunta é: quais são os impactos dessas mudanças?", questionou ele.
"Se quisermos evitar o aquecimento de 3º a 4º C em nosso planeta, não temos outra maneira além de sermos inteligentes ao usar os recursos naturais da Terra. Para isso, precisamos de ciência", alertou o acadêmico.
Segundo Artaxo, o Brasil precisa mudar radicalmente a produção de energia; o sistema de transportes, com menos carros; e incorporar pesquisas que visem adaptar a agricultura brasileira para outros cenários climáticos não tão favoráveis quanto os atuais. "Temos toda a tecnologia para fazer frente a isso. Basta termos políticas públicas consistentes", defendeu Artaxo.
Professora da Unifesp, doutora em biologia molecular pela Unifesp e presidente de honra da SBPC, a acadêmica Helena Bonciani Nader também alertou o público sobre a necessidade de ações pela defesa da ciência nacional. "Em nove anos, aumentamos em 51% o número de programas de pós-graduação e com qualidade pelo Brasil. Cerca de 1/3 dos programas são notas 5, 6 e 7 na Capes. Por que não conseguimos acertar no resto?", questionou a acadêmica.
Helena Nader se referiu ao ainda baixo e concentrado número de doutores, mais nas ciências humanas e menos nas ciências físicas, matemáticas, químicas e das engenharias. Outra fraqueza apontada pela acadêmica está no número de publicações, colaborações e impacto de citações. "De 2000 a 2016, o Brasil está no 14º lugar em número de trabalhos publicados. Mas com impacto de 9,3. Em termos de impacto de citações, de 2011 a 2016, viemos crescendo. Não podemos dizer que somos periféricos, mas eu quero estar no patamar de Canadá e EUA", afirmou Helena.
Ela chamou a atenção também para a ausência de uma política de estado no Brasil. "Entre os países dos Brics, há dez anos a China estava atrás do Brasil em termos de produção científica. O que mudou de lá para cá? Política de Estado. Mal temos uma política de governo, que dirá de Estado!", criticou a professora. Para Helena, se o país tivesse um Ministério do Desenvolvimento Econômico "efetivo", ele estaria preocupado com a posição de 69º lugar do Brasil em investimento em ciência e tecnologia.
"Até 2020 a China vai investir 2,5% do PIB em C,T&I. Já o Brasil, 1,27%, dos quais cerca de 0,7% é de recursos públicos e 0,5% de origem privada. A cada 0,4% aplicado em ciência e tecnologia, tem-se 5% de retorno no PIB, segundo relatório do FMI [Fundo Monetário Internacional] de 2016. Se não exigirmos de nossos candidatos uma postura clara e de defesa da ciência nacional, não vamos mudar esse cenário", alertou a acadêmica, encerrando a cerimônia da ABC.
Fonte: Academia Brasileira de Ciências