Por Gustavo Melo de Andrade Lima*
O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), tema urgente na atualidade, é uma doença que se manifesta por meio de sintomas como hiperatividade, impulsividade e desatenção. Comumente diagnosticado durante a infância, o TDAH pode persistir na idade adulta em até metade dos casos, e implica em consequências prejudiciais à saúde e à vida social do indivíduo, se não tratado adequadamente.
Um dos desafios desse transtorno do neurodesenvolvimento é que os sintomas podem passar desapercebidos pelos pais, professores, médicos e, com isso, por não ser realizado na infância, o diagnóstico torna-se mais difícil na idade adulta. Após a adolescência, com o passar dos anos, os sintomas do TDAH podem mudar de características, tornando-se menos intensos e, consequentemente, menos perceptíveis ao próprio paciente e aos profissionais de saúde. Mesmo assim, apesar de sintomas mais brandos, esses adultos não estão isentos do sofrimento que essa doença pode causar.
Estatisticamente, pelo menos metade das crianças, adolescentes e adultos com TDAH terão duas ou mais condições clínicas associadas, como desvios de conduta, transtorno opositivo desafiador, ansiedade, depressão, distúrbios de aprendizagem, transtorno da personalidade antissocial e abuso de substâncias ilícitas. É fácil pensar que uma criança ou adolescente com sintomas não tratados possa desenvolver outros transtornos. Imagine, por exemplo, um estudante que não consegue realizar as mesmas tarefas acadêmicas que o colega de turma, apresenta dificuldade em respeitar regras e, assim, é frequentemente cobrado pelos professores e pais, não estabelecendo amizades e retornando para casa exausto, com um “dever de casa” a ser cumprido. Possivelmente, essa pessoa se sentirá pior que as demais por não se adaptar às demandas escolares e sociais e poderá apresentar sintomas de auto depreciação, incapacidade e irritabilidade, facilitando o desenvolvimento de outros transtornos do humor. Aqueles sintomas que se apresentavam como hiperatividade na infância, na idade adulta podem se manifestar como sensações de inquietude, impaciência, labilidade, fadiga e serem confundidos com sintomas de ansiedade.
O TDAH tem prevalência de 2,5% a 5% nos adultos. Agora, imagine um indivíduo que possua o transtorno, mas em nenhum momento foi diagnosticado. Ele passará pela infância e adolescência vivenciando todas as adversidades descritas acima e quando chegar na idade adulta irá se deparar com outras demandas que podem ser tanto quanto, ou mais, angustiantes. Os adultos com TDAH têm três vezes mais chances de se envolverem em acidentes automobilísticos, maior tendência ao abuso de tabaco, álcool e drogas ilícitas, desvio de conduta, envolvimento com criminalidade, instabilidade em empregos e relacionamentos interpessoais. Portanto, o subdiagnóstico desse transtorno pode trazer impactos econômicos à sociedade.
O TDAH no adulto gera sintomas que podem ser identificados por meio dos seguintes questionamentos:
1) Você frequentemente se sente inquieto? (Nervoso, dificuldade em manter-se sentado, incomodado, ativo demais)
2) Você frequentemente age primeiro antes de pensar? (Impaciente, gasta muito dinheiro sem necessidade, fala sem pensar)
3) Você frequentemente tem problemas de concentração? (Facilmente distraído, não termina atividades que começou, sente-se entediado, esquecido, desorganizado)
Desde maio de 2013, após a publicação do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), uma maior atenção foi dada ao diagnóstico do TDAH no adulto com adaptação de alguns critérios e exemplificação de casos. É necessário que os sintomas tenham se iniciado antes dos 12 anos e estejam presentes em dois ambientes, como a casa, trabalho e/ou escola. Com isso, para que as informações sejam confiáveis em adultos, é necessário a ajuda de um informante que conheça a história do paciente.
A característica essencial do TDAH é o padrão persistente de desatenção e/ou hiperatividade-impulsividade com repercussão funcional, sendo melhor conduzido e tratado ao envolver medidas de adaptação ambiental, terapias específicas e medicamentos. Por ser uma doença com descrição relativamente recente e o reconhecimento no adulto ter sido feito somente na década de 1980, o seu comportamento, sintomatologia e consequências têm sido progressivamente mais compreendidos, assumindo uma tendência de evitar cada vez mais casos não diagnosticados e, consequentemente, diminuir o impacto pessoal, social e econômico dessa afecção.
*Médico neurologista voluntário do Ambulatório de Neurologia do Comportamento e Cognição da Unifesp
Referências:
- Mattos, Paulo et al. Painel brasileiro de especialistas sobre diagnóstico do transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH) em adultos. Rev. psiquiatr. Rio Gd. Sul [online]. 2006, vol.28, n.1, pp.50-60.
- Smith, Matthew. Hyperactive Around the World? The History of ADHD in Global Perspective. Social History of Medicine Vol. 30, No. 4 pp. 767–787
- Schachar, R. Àttentio Deficit Hyperactivity Disorder in Children, Adolescents and Adults. Continuum Lifelong Learning Neurol 2009;15(6):78–97.
- Ylva Ginsberg, MD, PHD. Underdiagnosis of Attention-Deficit/Hiperactivity Disorder in Adult Patients: A Review of the Literature. Prim Care Companion CNS Disorder 2014;16.
- Manual Diagnóstico e Estatístico de Doenças Mentais, DSM 5.
As opiniões expressas no artigo não representam a posição oficial da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).