Por Alexandre Milanetti
(Imagem ilustrativa)
Um grupo de 12 pesquisadores(as) do Brasil e do Reino Unido, incluindo professores(as) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) - Campus Baixada Santista, publicou um artigo no periódico Frontiers in Psychology. A publicação traz contribuições para as discussões sobre as ações e pesquisas locais alinhadas às demandas globais e como elas podem influenciar na qualidade de vida da sociedade e nas políticas públicas. A publicação foi um importante passo de integração entre profissionais das mais diversas áreas, que irá embasar novas pesquisas dessa parceria multissetorial e multinacional.
O artigo, que tem entre os(as) autores(as) pesquisadores(as) e profissionais de organizações da sociedade civil brasileira (Fundação SOS Mata Atlântica, Fundação Grupo Boticário e Hospital Israelita Albert Einstein) e de instituições públicas de ensino superior do Brasil (Unifesp e Universidade de São Paulo - USP) e do Reino Unido (Bangor University, do País de Gales), apresenta as perspectivas para a produção científica que responda às demandas assumidas em agendas internacionais, nacionais e locais.
“Esta publicação é resultado da soma de vários caminhos e prioridades institucionais e globais. Os temas - a escolha da integração das agendas de Década do Oceano e Saúde Única -surgiram da parceria entre Unifesp e Bangor University, em uma visita técnica que recebemos da doutora Patricia Masterson [primeira autora], que veio visitar a Unifesp em 2018. Ou seja, de uma ação de internacionalização, neste caso de uma parceria sustentável de dez anos entre Unifesp e Bangor University, surgiu a ideia do artigo”, explica Ronaldo Christofoletti, pesquisador do Instituto do Mar (IMar/Unifesp) - Campus Baixada Santista e membro do Comitê Brasileiro de Assessoramento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) para a Década do Oceano.
Emanuela Mattos, terapeuta ocupacional e coordenadora do Observatório Temático de Envelhecimento do Instituto Saúde e Sociedade (ISS/Unifesp) - Campus Baixada Santista, que também assina o artigo, destaca que, para melhorarmos a qualidade de vida da sociedade brasileira, este artigo aborda a integração de diferentes desafios. A pesquisadora e Christofoletti citam quatro destes desafios em forma de questionamentos: “Como a saúde humana, dos organismos vivos e do meio ambiente estão conectadas?; “Como o oceano, que cobre 70% do nosso planeta, se relaciona com o bem-estar humano?; Como pesquisadores e profissionais de outros setores da sociedade das áreas da saúde, meio ambiente, ciências sociais e comunicação podem atuar juntos para esta construção?; e Como estas oportunidades de integração ocorrem de forma sinérgica em países que vivem diferentes realidades socioeconômicas e culturais?”.
Após as perguntas, ambos(as) docentes da Unifesp convergem para uma resposta, em que o resultado de seu estudo enquanto pesquisadores(as) do Instituto do Mar e do Instituto Saúde e Sociedade mostra como o bem-estar humano e o do meio ambiente caminham de forma integrada.
Em relação à construção do artigo, o professor Christofoletti lembra que, no caso da Unifesp, trabalhar essas agendas de forma integrada trouxe a oportunidade de que colegas do ISS e IMar atuassem juntos. “Tivemos também discussões iniciais com colegas da EPE [Escola Paulista de Enfermagem], com os passos seguintes do paper sendo construídos também em parceria com a Escola Paulista de Medicina (EPM/Unifesp). Após pensar a ideia, trabalhamos o desenho da transdisciplinaridade, convidando colegas e também expandindo para outras instituições brasileiras. Quanto maior a diversidade de profissionais, melhor seria o resultado”, analisa o pesquisador.
Quando questionado sobre o que o artigo publicado na Frontiers sugere tanto para os indivíduos como para o poder público e governos, em termos de incentivo a essas práticas integrativas com o meio ambiente, o professor do IMar opina: “mudar comportamentos é um desafio. A pandemia nos mostrou isso, e até o uso das máscaras foi desafiador. Nas últimas décadas, o modelo de desenvolvimento econômico priorizou um entendimento do meio ambiente 'a serviço do homem' e, por isso, exploramos de forma não sustentável. Basta ver a quantidade de impactos existentes em ambientes terrestres, de água doce e marinho. Agora, cresce o conhecimento sobre a nossa associação direta com o ambiente e sobre como podemos nos beneficiar economicamente, culturalmente, socialmente e em termos de saúde com ambientes saudáveis. Caminhamos e nos fortalecemos para o desenvolvimento sustentável. Para que essa mudança de comportamento ocorra, precisamos trabalhar mais a relação com a sociedade, a comunicação, a sensibilização e o convite para que as pessoas compreendam, na prática, esses benefícios e ações e se envolvam em processos de ciência cidadã, contribuindo com a ciência”.
Em relação à mesma pergunta, Emanuela diz que, em sua leitura, “falta investimento em educação no sentido de conhecimento a respeito dos desdobramentos das ações e escolhas coletivas”. A professora do ISS acredita que a publicação traz também uma perspectiva ampliada do que é saúde a partir da Agenda 2030 e convida para as parcerias interssetoriais e transdisciplinares para que se possa chegar a uma proposta plausível de ser aplicada nos diversos contextos e culturas.
Sobre o processo de desconexão da humanidade com o meio ambiente, ela acredita que teve início com o capitalismo. “Os dados são imensos e têm impactos diretos, mais perceptíveis na saúde física, emocional e fisiológica, na forma como as relações vão se construindo, e impactos indiretos, que são mais invisíveis e difíceis para a população em geral conseguir compreender e que também afetam a saúde individual, coletiva, a qualidade de vida e bem-estar de todos os seres vivos e sua interrelação”, completa Emanuela.
Sobre o mesmo aspecto, Christofoletti atribui que esse processo ocorreu “no momento em que se passou a entender o meio ambiente como um produto que está aí para nos servir e, especificamente sobre o oceano, com a falta de ensino sobre este tema, com o pensamento que, por ele ser tão grande, sozinho se regenera”. O pesquisador destaca ainda que “o tempo provou que estávamos errados. O meio ambiente não está aqui para nos servir e nem mesmo é autossuficiente. Ele consegue se autorregular com um uso consciente e sustentável. E ele não está e nem nunca esteve como uma fonte para a sociedade humana. Nós, como seres humanos, somos mais uma espécie neste ambiente. Temos que compreender nossa relação com as demais espécies e ambientes e respeitar. Não somos melhores para explorar da forma que quisermos. Os impactos ambientais se revertem em problemas de saúde, econômicos e sociais, o que é um resultado desta leitura errada de uso dos recursos naturais”.
O professor da Unifesp informa que o estudo publicado no último mês de abril na Frontiers in Psychology é alinhado com uma demanda clara e iminente da sociedade para pesquisas socialmente referenciadas e que respondam às demandas sociais atuais, tema inclusive de um evento realizado pela Fundação de Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e outras agências no último mês de março (veja neste link).
Sobre os desdobramentos do artigo internacional, a terapeuta ocupacional Emanuela aponta para uma importante linha de pesquisa: “o impacto do ambiente na qualidade de vida e no bem-estar das pessoas com demência, seus cuidadores e família”. Já Christofoletti pensa que “esta é uma primeira contribuição, mas certamente, desta publicação, outras pesquisas nas áreas sociais, ambientais, da saúde e interdisciplinares vão emergir em breve”.