Por Cristina Soreanu Pecequilo*
Em junho de 2015, o empresário Donald Trump lançou sua candidatura à Presidência dos Estados Unidos, apresentando-se como um dos nomes que disputaria as primárias republicanas em 2016. A ação foi vista como uma aventura, produto da vaidade de Trump, e que logo se esgotaria. Logo em janeiro, quando as convenções estaduais se iniciaram, estas avaliações caíram por terra e pouco tempo depois, contrariando todas as expectativas, Trump foi confirmado candidato republicano. Apesar do crescimento de grupos internos que defendiam a linha “nunca Trump”, nenhuma força parecia capaz de barrar a avalanche, cenário que se reproduziu em novembro em escala nacional, derrotando no Colégio Eleitoral a democrata Hillary Clinton. Trump, assim como W. Bush, perdeu o voto popular por cerca de 600 mil votos. Se a eleição fosse direta para presidente, como é em vários países democráticos, a vencedora seria Hillary Clinton. Em apenas 15 anos, dois pleitos apresentaram esta disparidade: de 538 delegados, Trump conquistou 290, contra 232 de Hillary, sem que isso reflita a vontade da população. Diferente do ano 2000, quando muitos foram às ruas contra este sistema, o que se observa são apenas protestos contra a pessoa de Trump e não contra o mecanismo indireto que o levou ao poder. E, como bom político, perfil que nega para si, Trump se beneficiou do mesmo sistema que tanto critica. |
Mas Trump não ganhou só por esta “tecnicidade”: sua vitória deriva da profunda cisão social que se apresenta. Muros nas fronteiras, nacionalismo, desrespeito aos direitos sociais de raça e gênero, fechamento dos mercados comerciais, incitação à violência (verbal e física) foram alguns dos pilares desta campanha de baixo nível. Ao explorar o medo, o preconceito e a ignorância, fazer promessas populistas de emprego e renda, externalizando os problemas, Trump deu voz à xenofobia, ao individualismo e à busca de soluções simples que assolam nosso tempo.
Espera-se um presidente com maior tendência unilateral, não necessariamente isolacionista: retirar os Estados Unidos do acordo climático global, pressionar aliados e instituições internacionais, combater o Estado Islâmico ao lado da Rússia, barrar a imigração ilegal (deportar os que já vivem no país), abrir “guerra comercial” com a China são apenas algumas promessas que devem ser buscadas. Outras possibilidades? Estagnar o processo de abertura com Cuba e distanciar-se da América Latina. Por fim, observa-se a crescente validação de candidaturas similares globalmente, e que já vinham crescendo na esteira da crise econômica e social.
Essas são as consequências que se deve esperar e que refletem os erros táticos “do lado de lá”. Afinal, se Trump ganhou também o foi pela escolha de Clinton e pelo silêncio das forças progressistas que assistiram, sem reagir, a evolução de sua candidatura, subestimando-a. Se não há resposta, e se há apaziguamento, o vácuo é ocupado, e assim o foi por Trump.
Fotos: Hillary Clinton.com e Michael Vadon/Fotos Públicas
*Professora de Relações Internacionais da Escola Paulista de Economia, Política e Negócios (EPPEN) - Campus Osasco da Unifesp e autora de "Os Estados Unidos e o Século XXI"
As opiniões expressas no artigo não representam a posição oficial da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).