Por Alexandre Milanetti
Causada por um vírus do gênero Orthopoxvirus da família Poxviridae, que pode estar presente em roedores, a varíola dos macacos é uma doença rara e geralmente restrita às regiões central e ocidental do continente africano. Porém, casos da doença (monkeypox, em inglês) não param de surgir neste primeiro semestre de 2022 em países onde a doença não é endêmica, principalmente na Europa, EUA e, mais recentemente, na América Latina. O Brasil já contabilizou 14 casos confirmados até o dia 23 de junho segundo informações do Ministério da Saúde. A Organização Mundial da Saúde (OMS) vem atualizando a quantidade de casos, a forma de transmissão e os sintomas que envolvem a doença "prima" do vírus da varíola comum, que foi erradicado do planeta em 1980.
A monkeypox é considerada uma zoonose viral – o vírus é transmitido aos seres humanos a partir de animais –, com sintomas muito semelhantes aos observados em pacientes com varíola, embora seja clinicamente menos grave. O período de incubação da varíola dos macacos é geralmente de seis a 13 dias, mas pode variar de cinco a 21 dias, segundo a OMS.
Apesar de pouco frequente, a varíola dos macacos pode afetar humanos e causar sintomas como calafrios, dor muscular e nas costas, cansaço excessivo e aparecimento de bolhas e feridas na pele, que podem coçar ou ser doloridas. Uma questão que está intrigando especialistas é o motivo de o vírus estar se comportando de maneira diferente daquela estudada, já que, segundo a OMS, a transmissão normalmente ocorria de forma esporádica em regiões específicas da África e de animais para pessoas. A contaminação entre seres humanos, embora possível, era considerada pelos cientistas da entidade limitada até certo ponto.
"Nestes países com casos recentes, está havendo agora a confirmação de casos secundários, ou seja, pessoas que não viajaram para áreas endêmicas estão se contaminando por outras pessoas. Trata-se de um comportamento inusitado para esse vírus. É a primeira vez em que isso é relatado nesses lugares", analisa Marcelo Nascimento Burattini, professor de doenças infecciosas e parasitárias da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
A transmissão da varíola dos macacos ocorre por contato próximo com lesões, fluidos corporais, gotículas respiratórias e materiais contaminados, como roupas de cama. A OMS relata que a transmissão de humano para humano está ocorrendo entre pessoas em contato físico próximo com casos sintomáticos.
A varíola geralmente é autolimitada, ou seja, pode ser curada com o tempo e sem tratamento, mas pode ser grave em alguns indivíduos, como crianças, mulheres grávidas ou pessoas com imunossupressão devido a outras condições de saúde. O atual surto é classificado pela OMS como "altamente incomum".
Atualmente, não há evidências de que o vírus tenha sofrido mutação para uma forma de transmissão sexual. "A transmissão é fundamentalmente por contato direto, por meio da secreção das vesículas, que são essas espécies de bolhas que surgem na pele, ou por contato muito próximo, por via respiratória, por exemplo", reitera Burattini.
O Centro para Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos explica em seu site que, embora atualmente não haja tratamentos específicos disponíveis para a infecção por varíola, os surtos podem ser controlados com medicamentos disponíveis no mercado, os quais foram aprovados e se mostraram eficazes contra a doença, entre eles o cidofovir, o ST-246 e a imunoglobulina vaccinia.
A varíola é causada por um vírus conhecido e que tem afetado comunidades por décadas, tendo sido possível desenvolver vacinas e tratamentos. Como o vírus da varíola do macaco está intimamente relacionado ao que causa a varíola, a vacina desenvolvida contra a varíola se mostrou eficaz para ambas as doenças, com, pelo menos, 85% de eficácia na prevenção da varíola dos macacos.
A OMS afirma que algumas pessoas que receberam vacinas contra a varíola também podem ter certos níveis de imunidade, embora, em muitos países, essa vacinação tenha sido suspensa há quase 40 anos, quando a doença foi considerada erradicada. No Brasil, a varíola foi considerada erradicada em 1973, e a vacinação contra a doença foi suspensa em 1979.
A Agência de Segurança da Saúde do Reino Unido revela que, diferentemente de outras doenças contagiosas, a varíola dos macacos não se espalha facilmente entre as pessoas e que, em surtos anteriores, uma pessoa infectada transmitia o vírus, em média, para no máximo uma pessoa, de modo que os níveis de contágio eram muito baixos.
O professor Burattini ressalta que um dos maiores mistérios do avanço da varíola dos macacos neste momento é o número inesperado de casos e a dispersão rápida por diferentes países e continentes. "Essa é uma doença que não deveria ter esse comportamento", fala o pesquisador da Unifesp. Uma hipótese que deve ser considerada – e propriamente investigada – é a maior mobilidade, a ânsia por viagens e o maior contato entre as pessoas após os dois anos da pandemia de covid-19.
O diagnóstico da varíola dos macacos pode ser feito por um infectologista ou clínico geral por meio da avaliação do histórico de saúde e dos sintomas apresentados. Para a confirmação da doença, normalmente é realizada a coleta da secreção da ferida, que é analisada em laboratório por meio do teste de PCR, com o objetivo de identificar o vírus responsável pela doença.
O nome monkeypox se origina da descoberta inicial do vírus em macacos em um laboratório na Dinamarca em 1958. O primeiro caso humano foi identificado em uma criança na República Democrática do Congo no ano de 1970. Existem duas linhagens do vírus da varíola dos macacos: o da África Ocidental e o da Bacia do Congo (África Central). As infecções humanas com a linhagem da África Ocidental parecem causar doenças menos graves (3,6% de taxa de mortalidade) em comparação com a outra (Bacia do Congo), que tem taxa de mortalidade de 10,6% segundo dados da OMS. Os países onde a varíola dos macacos é considerada endêmica são: Benin, Camarões, República Centro-Africana, República Democrática do Congo, Gabão, Gana (identificada, até o momento, apenas em animais), Costa do Marfim, Libéria, Nigéria, República do Congo, Serra Leoa e Sudão do Sul.
Embora as autoridades de saúde apontem que ainda não há muitas informações sobre os novos surtos e suas possíveis vias de transmissão, elas garantem que atualmente não há motivo para pânico nem grandes riscos para a sociedade.