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Tecnologia ajuda a decifrar sofrimento em bebês
Software desenvolvido por pesquisadores da Unifesp automatiza a identificação de expressões de dor em recém-nascidos
Valquíria Carnaúba
A Associação Internacional para o Estudo da Dor define essa sensação como “uma experiência sensorial e emocional desagradável, associada a uma lesão tecidual real ou potencial, que pode ser descrita nos termos dessa lesão”; assim, “a dor é sempre subjetiva” (1979). A dor e suas implicações motivam constantes avanços na Neonatologia, pois afligem recém-nascidos e prematuros, que chegam ao mundo sem saber expressá-la, muito menos fisiologicamente maduros para lidarem com ela. Daí a relevância de projetos como o conduzido por Ruth Guinsburg, professora titular do Departamento de Pediatria da Escola Paulista de Medicina (EPM/Unifesp) – Campus São Paulo, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp): um software concebido para detectar, em tempo real, expressões faciais de dor em bebês.
Os estudos iniciais para a criação desse software foram realizados há mais de dez anos pela fisioterapeuta especialista em Fisioterapia Respiratória Pediatrica e mestre em Engenharia Biomédica, Tatiany Marcondes Heiderich. Entretanto, o projeto foi colocado em prática somente em 2009 - com a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Unifesp -, durante o curso de doutorado em Ciências Aplicadas à Pediatria na EPM. “Meu interesse pelo assunto foi despertado quando percebi que nessa faixa etária todas as análises eram visuais e apontadas manualmente. Foi o contato com a Engenharia Biomédica que me inspirou a buscar ferramentas para automatizar esse processo”, afirma a pesquisadora.
A metodologia que Tatiany utilizou abrange a detecção de dor por meio da escala Neonatal Facial Coding System (NFCS), um guia que determina pontos dos rostos dos recém-nascidos que indicam a presença de dor. Capaz de aferir a sensação utilizando-se de um conjunto de parâmetros, como fronte proeminente com aproximação das sobrancelhas, olhos espremidos, fenda nasolabial aprofundada e lábios esticados de forma horizontal ou vertical, a escala é uma das mais bem conceituadas na literatura da área por ter uma especificidade muito alta e uma reprodutividade interessante.
Biometria
A validação do software – que busca assegurar o fornecimento de resultados confiáveis – foi realizada a partir da captação de imagens de 30 recém-nascidos na unidade de Neonatologia do Hospital São Paulo/Hospital Universitário da Unifesp, entre junho e agosto de 2013. Os bebês, cujo tempo de vida variava entre 24 e 168 horas, não apresentavam malformações congênitas e não necessitavam de suporte ventilatório ou sonda gástrica.
Antes do início das gravações, os bebês foram fotografados em momentos de relaxamento para que as imagens fossem usadas como parâmetro em relação à mudança de expressões. As imagens posteriores foram realizadas simultaneamente por três câmeras, durante 24 horas por dia, permitindo o mapeamento de mais de 60 pontos da face; tais pontos levaram à padronização utilizada pelo sistema de identificação biométrica, uma característica do programa.
Todos os relatórios gerados pelo software foram avaliados por seis profissionais especializados em Neonatologia, que compararam as fotos dos bebês antes, durante e depois de passarem por procedimentos médicos dolorosos e determinaram a presença ou não de dor em cada uma delas. Com base nessas constatações, o programa mostrou-se eficaz na identificação dos sinais de dor de todos os bebês flagrados em algum momento de sofrimento. No entanto, quando o mesmo documento foi repassado a médicos e enfermeiros da área, apenas 77% deles conseguiram detectar as expressões de dor.
De acordo com a pesquisadora, o desenvolvimento posterior do software tornará viável a geração de um relatório baseado na escala NFCS, que indicará quantas vezes o paciente apresenta face de dor no período de tempo em que é filmado. Isto poderá abrir caminhos para o controle da analgesia sistêmica em recém-nascidos (além de seus efeitos colaterais), a eliminação de lacunas existentes nos métodos de avaliação da dor por escalas, a supressão do sofrimento nas unidades de tratamento intensivo (UTIs) e, claro, a queda da mortalidade infantil.
Projeto em fase inicial
Apesar da inovação ser muito bem-vinda, o projeto encontra-se em sua fase nascente. O sistema de captação de imagens – que é composto de um computador central e de três câmeras à beira do leito – depende ainda da posição do neonato para garantir sua eficácia. “O que fizemos até o momento foi a validação do software para situações de um bebê a termo [bebê nascido após o período normal de gestação] com dor aguda, permitindo-se que a programação traduzisse a face da criança”, explica Ruth. “Porém, o programa ainda precisa de uma série de melhorias para só então ser colocado em prática”.
Os próximos passos para a aplicação definitiva do software incluem a observação de seu desempenho dentro de uma unidade de terapia intensiva e o refinamento de suas funções, como enumera Tatiany. “É preciso reestruturá-lo e implementar métodos de análise da orelha, língua e área (delimitada) superior da face, que ajudarão a detectar novos movimentos – como o tremor de queixo –, além de aperfeiçoar o método de captura das imagens.”
Quanto a outras aplicações, Ruth é otimista: “Existe a possibilidade de, no futuro, profissionais da área adequarem a aplicação do programa em crianças acometidas por deficiências graves que não conseguem expressar a dor.”
Expressões de dor no recém-nascido, segundo a escala NFCS
O sistema desenvolvido é baseado na escala Neonatal Facial Coding System (NFCS), utilizada no reconhecimento de movimentos faciais de dor, convertida em linguagem de computador com o suporte do Departamento de Informática em Saúde (DIS) da Escola Paulista de Medicina (EPM)
Artigo relacionado:
HEIDERICH, Tatiany Marcondes; LESLIE, Ana Teresa Figueiredo Stochero; GUINSBURG, Ruth. Neonatal procedural pain can be assessed by computer software that has good sensitivity and specificity to detect facial movements. Acta Paediatrica, [s.l.], v. 104, n. 2, p. e63-e69, fev. 2015. Disponível em: . Acesso em: 8 abr. 2015.