Ana Cristina Cocolo
Entender os contextos culturais, sociais e políticos de como as informações sobre o clima são recebidas pela comunidade geral e por alguns setores econômicos – como a agricultura, a gestão de recursos hídricos e a geração de energia elétrica, por exemplo – não é tarefa fácil, mas extremamente importante para um país. Entender os estudos e previsões sobre o clima, e utilizá-los de forma prática, em cada região e área específica, é no que muitos pesquisadores vêm trabalhando incessantemente, como é o caso de Renzo Taddei, professor do Instituto do Mar (Imar/Unifesp) – Campus Baixada Santista.
“O clima sempre foi uma coisa importante, tanto na vida política quanto religiosa da sociedade, muito antes da existência da Meteorologia”, afirma ele. “Uma das hipóteses de o porquê a civilização maia, que era um império, ruiu, foi a ocorrência de uma seca muito grande que acabou desorganizando-a politicamente”.
As linhas de pesquisa do docente, voltadas aos estudos sociais da ciência e da tecnologia, aos conflitos ambientais, à percepção de risco e às controvérsias climáticas, resultaram em uma parceria entre pesquisadores de quatro países – Brasil, Argentina, Paraguai e Estados Unidos – que pretendem, juntos, facilitar esse trabalho com a pesquisa Rumo à uma Ciência do Clima Utilizável. O estudo tem o financiamento do Instituto Interamericano para Pesquisa em Mudanças Globais (IAI) e conta com a participação de pesquisadores não só da Unifesp, mas também do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (CPTEC/Inpe), do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), da Universidade de Passo Fundo (UPF), da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e da Embrapa Trigo.
A coordenação geral da pesquisa está a cargo da antropóloga e filósofa Cecilia Hidalgo, da Universidade de Buenos Aires. “O projeto é uma tentativa de construir redes de cooperação entre meteorologistas e outros cientistas, particularmente aqueles que trabalham no campo das ciências aplicadas, e, no caso desse projeto, hidrólogos e agrônomos, para que a informação já saia da Meteorologia formatada de uma maneira que se encaixe produtivamente nas formas de trabalho dessas áreas”, explica Taddei.
O estudo pretende entender as causas da dificuldade do uso das informações meteorológicas pela população em geral e por setores econômicos selecionados, integrar estratégias de comunicação climática entre os três países da Bacia do Prata (Argentina, Paraguai e Brasil) e traçar um diagnóstico das necessidades institucionais para suprir as demandas da provisão de serviços climáticos ao universo de usuários de cada país. O foco, à princípio, serão as regiões sul do Brasil, nordeste da Argentina e oeste do Paraguai.
De acordo com ele, a dificuldade de percebermos, mesmo com os melhores equipamentos científicos, as variações e ciclos dos ecossistemas é decorrente do monitoramento sistemático dos ecossistemas e da atmosfera ser ainda recente – datada de 1960 –, o que limita a base de dados históricos a ser usada nos estudos. Além disso, o conhecimento agregado por populações tradicionais que habitam os ecossistemas há centenas de anos – no caso do Brasil, por índios, caboclos, ribeirinhos, etc – é desvalorizada e interpretada como uma visão atrasada e supersticiosa frente ao conhecimento científico atual. “São muito poucas, ao redor do mundo, as iniciativas de transformação de conhecimento tradicional em material que possa engajar-se de forma significativa com as discussões técnicas e científicas a respeito de como entender o meio ambiente e os desastres a eles relacionados”.
Um dos frutos do projeto em andamento consiste na publicação do livro Meteorologistas e Profetas da Chuva, de autoria de Taddei, e a tradução, no ano passado, do guia A Comunicação das Mudanças Climáticas, produzido por um grupo de estudiosos da Universidade de Columbia (EUA), do qual o pesquisador também é membro.