Lu Sudré
Imagem: enz1m3 (CC BY-SA 2.0)
A captura de tubarões aumentou significativamente nos últimos anos e pode levar algumas espécies à extinção. O alarmante cenário é resultado, principalmente, da intensificação do consumo de uma sopa produzida com as nadadeiras do animal, muito apreciadas em algumas culinárias, especialmente a da China, além do consumo de sua carne. Atualmente a pesca movimenta um lucrativo mercado globalizado, tendo o Brasil como um grande exportador das nadadeiras, que são enviadas principalmente por meio dos portos em Itajaí (SC), Belém (PA) e Natal (RN).
Legalizado no país, o comércio das barbatanas deve seguir regulamentações como a obrigatoriedade de identificação de todas as espécies no livro de bordo das embarcações e em todo o processo até o despacho para China, além da indispensabilidade do desembarque dos tubarões com suas nadadeiras naturalmente aderidas, como forma de combate à prática do finning, método em que apenas as nadadeiras são cortadas, seguido da devolução dos tubarões ao mar. Os poucos tubarões que resistem ao processo sofrem uma morte lenta e dolorosa.
Apesar da lei, a prática ainda é muito registrada. Barcos estrangeiros já tiveram grandes lotes de barbatanas apreendidos devido a irregularidades quanto à declaração das espécies, fato que configura crime ambiental.
A identificação morfológica dos tubarões é um dos empecilhos na fiscalização de diversas espécies protegidas, já que são animais muito semelhantes entre si e que, ainda por vezes, têm suas cabeças e nadadeiras cortadas antes do desembarque, fator que atrapalha o trabalho nas estatísticas pesqueiras. De acordo com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), apenas 20% do total das capturas de tubarões e raias no Brasil recebem alguma menção à classificação taxonômica e, mesmo assim, na maioria dos casos refere-se apenas aos nomes populares, e, muitas vezes, esta identificação é referência para mais de uma espécie.
Coordenado pelo docente Fernando Fernandes Mendonça, o Núcleo de Genética Pesqueira e Conservação (Genpesc) do Laboratório de Biotecnologia Marinha do Instituto do Mar (IMar/Unifesp) – Campus Baixada Santista passou a aplicar a genética forense em tubarões e raias, resultando no desenvolvimento de marcadores genéticos para a identificação das espécies mais frequentes nas pescarias e que pode até mesmo apoiar investigações e processos de órgãos oficiais do governo no combate à captura e comércio de espécies ameaçadas.
Mendonça aplica genética forense para a identificação de espécies desde sua pesquisa de mestrado, desenvolvida em 2006
“As amostras para estudos científicos, pequenos fragmentos de qualquer parte dos tubarões, são recolhidas nos desembarques da pesca e em pontos de venda. Em seguida são levadas ao laboratório para análise. Nesses estudos são comumente encontrados exemplares do tubarão-martelo Sphyrna lewini, dos cações-anjo Squatina guggenheim e Squatina oculta e da raia-viola Pseudobatus horkelli. Todas estas espécies ameaçadas e sob proteção legal com proibição da captura, embarque e comercialização”, afirma Mendonça.
Após desenvolver métodos que utilizam regiões específicas do genoma e geram fragmentos de análises em eletroforese, técnica usada para separar fragmentos de DNA, o Genpesc passou a utilizar também a metodologia de DNA Barcoding, que possibilita a leitura das sequências de DNA em um determinado gene e permite a identificação de espécies de maneira semelhante a um código de barras comum.
Segundo Mendonça, em uma análise de DNA de uma apreensão de nadadeiras efetuada pelo Ibama no litoral do Rio Grande do Norte, foi comprovado o crime ambiental em ao menos 12% das nadadeiras destinadas à China, pela declaração falsa do nome das espécies. Além das declarações falsas, também foi identificado a pesca e comércio de espécies ameaçadas e atualmente protegidas no Brasil, dentre elas o tubarão-das-galápagos Carcharhinus galapagensis, (criticamente ameaçado), cação-fidalgo Carcharhinus obscurus (ameaçado) e tubarão-bico-fino Carcharhinus perezi (vulnerável).
Considerada uma iguaria na China e símbolo de ascensão social, a sopa de barbatanas é um consumo antigo dos povos chineses e, além do status social, foi difundida como um prato de características medicinais e afrodisíacas. Atualmente, existem diversos grupos de ambientalistas que combatem a exploração dos tubarões para este fim. “O fim da cultura do consumo deve ser ainda mais trabalhado do que o próprio combate à captura e comércio dos tubarões”, pontua Mendonça.