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Bactérias tratam água poluída por refinarias de petróleo

É a primeira vez que a ação desses microrganismos é testada diretamente no efluente industrial e não em material sintético

Da redação
Com colaboração de Lu Sudré

grafismo agua
Entreteses04 p035 refinarias de petroleo

As refinarias de petróleo poluem grande quantidade de água com seu efluente industrial, com alta concentração de contaminantes tóxicos

A produção industrial do petróleo feita em refinarias desencadeia um grave problema ambiental. O processo de extração do óleo bruto polui uma enorme quantidade de água que, ao entrar em contato com uma alta concentração de contaminantes tóxicos, não pode ser reutilizada. A água devoluta do processo, conhecida como “água ácida”, contém fenóis, amônia e gases sulfídrico e cianídrico que, entre outras substâncias, são tóxicos para o meio ambiente e para a saúde humana.

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A pesquisadora Elen Aquino trouxe a linha de pesquisa que estuda a biorremediação para a Unifesp - Baixada Santista

Elen Aquino Perpetuo, professora do Instituto do Mar da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), no Campus Baixada Santista, ao estudar o contaminante fenol, um composto orgânico que contém o grupo funcional hidroxila (-OH) ligado diretamente a um carbono de anel aromático, identificou que duas bactérias gram-negativas - a Achromobacter sp. e Pandoreae sp. - são capazes de reduzir a concentração tóxica do contaminante no efluente que resulta do refino do petróleo. Muitos estudos têm reportado o isolamento de bactérias com capacidade de biodegradação de contaminantes, como hidrocarbonetos aromáticos, sendo a maioria dessas bactérias gram-negativas. Esse termo é utilizado para classificar bactérias com base na estrutura da sua parede celular.

“O maior problema das refinarias é que o resíduo não pode ser direcionado à estação de tratamento de efluentes por possuir uma carga tóxica que pode dizimar por completo a microbiota, que é o conjunto de microrganismos que habitam o ecossistema da lagoa de tratamento”, explica a pesquisadora.

A finalidade das refinarias é potencializar o rendimento de substâncias provenientes do petróleo como a gasolina e o gás liquefeito de petróleo (GLP), aplicando um processo químico denominado craqueamento catalítico. Após a destilação fracionada e a vácuo, o craqueamento é responsável por fazer a conversão de frações pesadas do petróleo em mais leves, e dessa forma quebrar moléculas maiores e as tornar menores, sendo estas de maior interesse comercial. As concentrações de contaminantes tóxicos nesse efluente industrial podem variar de 100 a 1.000 ppm [partes por milhão]. As refinarias implementam tratamento para a remoção do sulfeto e de amônia, mas o procedimento não é suficiente para remover também o fenol.

Entreteses04 p036 bacterias

Imagens microscópicas das bactérias Achromobacter sp. e Pandoreae sp.

Bactérias capazes de degradar contaminantes são conhecidas pela literatura científica. O diferencial da pesquisa em questão é o tratamento de um efluente real. “Os estudos geralmente são feitos em ambiente estéril e com efluente sintético (produzido em laboratório), e na maioria das vezes contendo somente um contaminante modelo. O inédito da pesquisa é a possibilidade de se tratar um efluente real, recolhido diretamente da refinaria, o qual possui uma mistura de contamintantes”, afirma a docente. As amostras de efluente fenólico foram cedidas pela refinaria Presidente Bernardes, pertencente à Petrobras, localizada no município de Cubatão em São Paulo.

O estudo se iniciou em parceria com o Centro de Capacitação e Pesquisa em Meio Ambiente (Cepema), coordenado pela Universidade de São Paulo (USP), e apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Ao deixar uma solução de fenol exposta ao meio ambiente, a pesquisadora notou que o material começou a turvar, o que evidencia crescimento celular. Sendo o fenol a única fonte de carbono da solução, constatou-se que bactérias aeróbicas estavam degradando o composto.

As bactérias do gênero Achromobacter sp. e Pandoreae sp foram detectadas após o isolamento de todas as microbiotas ativas na solução. A biorremediação natural consiste no processo de regeneração de equilíbrio do ecossistema original de um ambiente poluído por atividades antrópicas e é reconhecida como uma das soluções de mais baixo custo para a limpeza de água e solos contaminados. Essa técnica, no entanto, pode ser otimizada por técnicas de bioaumentação e bioestimulação, em que há a aceleração e a atenuação do processo natural.

Segundo a pesquisadora, o descarte de água com substâncias fenólicas permitido e determinado pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) é de 0,5 miligramas por litro, sendo que nas amostras utilizados como objetos de estudo apresentaram uma concentração de 500 miligramas de fenóis por litro, número mil vezes maior que o limite de descarte. Por meio do processo da biorremediação, o efluente industrial pode ser purificado e alcançar os limites permitidos para o descarte nas lagoas de tratamento sem prejudicar a biodiversidade da área.

Processo de biorremediação

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As etapas do processo de biorremediação:
1) água com contaminante fenólico;
2) água despoluída após processo de biorremediação;
3) água filtrada com carvão aditivado.

“Ao degradar o fenol do efluente, as bactérias permitem o reuso de uma água que seria desperdiçada ao ser estocada. Além da economia de água para a indústria, há o controle no gasto de dinheiro. Há, portanto, um ganho econômico e ambiental”, destaca Elen. O tratamento biológico é responsável por retirar todos os resíduos da “água ácida”, mas não modifica o seu aspecto visual. A água, de coloração marrom, ainda passa por um processo de filtração feita com carvão ativado para remover a cor e obter uma aparência “mais limpa”.

No laboratório foram tratados de dois a três litros do resíduo industrial. Para aplicação do processo em larga escala, a pesquisadora desenvolveu um protótipo de cilindro biológico em conjunto com o Cepema. “Nos perguntamos como seria tratar 500 litros, por exemplo. A ideia é que o protótipo real seja um cilindro biológico de metal que permita a aeração. Como essas bactérias são aeróbicas, é necessária a presença de oxigênio no processo, que pode ser obtido por meio da aeração”, comenta Elen. 

O cilindro promoveria a aeração e seria, ao mesmo tempo, um suporte para o aquecimento bacteriano. Com o modelo de uma roda de água, ficaria parcialmente imerso no efluente contaminado pelo fenol e ao mesmo tempo exposto ao ar, em um movimento cíclico. Ainda não há confirmação de parceria com a Petrobras para a concretização do projeto.

O efluente tratado por meio da biorremediação pode ser reutilizado apenas para fins industriais. Apesar de imprópria para uso humano, a água se torna completamente livre dos principais contaminantes tóxicos, que exterminaria comunidades aquáticas, por exemplo, e promove a economia de um bem escasso, porém, essencial à vida humana.

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