Opinião: Brasil pode se tornar um dos principais responsáveis pela extinção de tubarões no mundo

País é o maior consumidor da carne do animal

 

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Tubarao Azul Credito V Guy Marcovaldi
Crédito: Guy Marcovaldi

 

Por Fabio S. Motta*

 

De acordo com estudo produzido por pesquisadores brasileiros e que acaba de ser publicado no periódico científico Marine Policy (Política Marinha), o Brasil caminha a passos largos para se tornar um dos principais responsáveis pelo declínio das populações de tubarões de mar-aberto do mundo.

Analisando informações de diversas fontes (bancos de dados internacionais, boletins governamentais, artigos científicos, internet e outras), o grupo, liderado pelo biólogo Rodrigo Barreto – bolsista do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Biodiversidade Marinha do Sudeste e Sul do Brasil (CEPSUL-ICMBio) –, traçou um panorama detalhado sobre os fatores que têm contribuído para o protagonismo negativo do Brasil. Segundo Barreto, um dos motivos é a crescente demanda internacional pelas barbatanas de tubarões – um dos derivados pesqueiros mais caros do mundo –, o que leva o país a ocupar a 11ª posição dos que mais capturam esses animais e a 17ª colocação entre os que mais exportam barbatanas, utilizadas como iguaria de luxo na culinária asiática.

Entretanto, existe o agravante de que essas estimativas estejam subestimadas, considerando principalmente o fato das pescarias ilegais, cujo os números só vêm à tona quando se analisa o volume de barbatanas apreendidas pelo IBAMA em operações de fiscalização. Para se ter uma ideia, entre os anos de 1998 e 2014, aproximadamente 85 toneladas de barbatanas foram obtidas de forma ilegal no país, o que corresponde a cerca de 4.250 toneladas de tubarões, ou seja, quase 20% da produção anual de tubarões reportada pelo Brasil.

Surpreendentemente, a situação não para por aí. O país figura como o maior consumidor de carne de tubarão do mundo, importando quantidades de tubarão-azul próximas à sua produção total de peixes cartilaginosos, que incluem as raias também. Entre 2002 e 2012, o Brasil absorveu praticamente toda produção de tubarão-azul do Uruguai.

Este cenário se reflete nos resultados da última avaliação conduzida pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) sobre o estado de conservação dos tubarões e raias da costa brasileira. Cerca de 33% do total das 145 espécies avaliadas estão ameaçadas. Para se ter uma real dimensão do problema, este percentual é superior ao registrado na avaliação feita em âmbito global, que é de 25%. Lamentavelmente, os resultados deste esforço, até o momento, pouco influenciaram a agenda de conservação destes animais. Na verdade, eles foram incorporados à polêmica Portaria MMA no 445, que, desde a sua publicação em dezembro de 2014, esteve a maior parte do tempo anulada por ações judiciais.

Paralelamente a tudo isso, a estrutura de gestão da pesca no Brasil, que já não vinha produzindo a estatística pesqueira nacional desde 2007, foi desmontada com a extinção do Ministério da Pesca, o enfraquecimento dos comitês de gestão e a troca constante da estrutura governamental responsável em administrar o setor.

Hoje, um grupo de trabalho intersetorial, coordenado pelo MMA, vem se reunindo em Brasília na tentativa de delinear estratégias de resposta à perda da biodiversidade marinha diagnosticada pela avaliação das espécies ameaçadas e levada à tona por meio da Portaria no 445. Apesar disso, os pesquisadores destacam a importância do Brasil urgentemente reestruturar seus sistemas de coleta de informações pesqueiras, suas estratégias de gestão, bem como aprimorar os regulamentos sanitários e de rotulagem para a comercialização de peixes.

* Professor do Laboratório de Ecologia e Conservação Marinha do Instituto do Mar do Campus Baixada Santista da Unifesp e um dos autores da pesquisa citada.