A edição do dia 20 de abril de 2021 do jornal Estadão publicou um artigo sobre o lançamento oficial da Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável no Brasil, que acontece nesta data, assinado pelo Professor do Campus Baixada Santista da Unifesp, Ronaldo Christofoletti, membro do Communication Advisory Board for the UN Ocean Decada - IOC UNESCO, um dos brasileiros indicados para representar o Brasil neste processo.
A Década do Oceano é um evento mundial, idealizado pelas Nações Unidas em 2017, que pretende mobilizar cientistas, gestores, políticos e toda a sociedade a protegerem o oceano que, apesar de cobrir 71% da superfície do planeta Terra, é pouco conhecido e conservado.
As Nações Unidas declararam a Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável entre os anos 2021 e 2030 para construir uma abordagem integrada e garantir que a ciência oceânica apoie plenamente os países na implementação da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. No Brasil, o planejamento de ações para a Década da Ciência Oceânica é liderado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), Unesco Brasil e uma série de parceiros, para fomentar o debate sobre a geração de conhecimento e uso do espaço costeiro e marinho no país. A ciência que precisamos para o oceano que queremos.
Confira abaixo o texto na íntegra:
O oceano começa em casa
Quando não descartado de forma correta, o lixo que produzimos, pode acabar no mar
Ronaldo Christofoletti, O Estado de S.Paulo
20 de abril de 2021 | 03h00
Todos nós, em qualquer lugar do Brasil, temos uma relação com o oceano e nem sempre nos damos conta disso. Ele cobre mais de dois terços da superfície da Terra e é responsável por fornecer alimentos, energia, fármacos e minerais, assim como serviços econômicos e sociais, aos seres vivos. Por meio das algas marinhas, produz mais da metade do oxigênio do planeta. Absorve grande parte dos gases de efeito estufa que são lançados diariamente na atmosfera, contribuindo para a regulação climática. Assim, a chuva, o clima e a temperatura que influencia são determinantes para diversas atividades, como a agropecuária. Dele dependem o comércio nacional e internacional, o turismo, a pesca e a aquicultura, entre outras.
No mundo, o oceano contribui diretamente com cerca de US$ 1,5 trilhão para a economia, sendo que apenas o setor de alimentos gera em torno de 237 milhões de empregos. A carne de peixe responde por aproximadamente 17% do consumo de proteína animal. Em países menos desenvolvidos, esse número pode chegar a 50%. No entanto, se os peixes que essas populações consomem entram em contato com poluentes, eles se tornam potenciais problemas para a saúde.
Considerando a importância do oceano para a humanidade, a Organização das Nações Unidas (ONU) instituiu a Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável, um movimento global e com diversos atores que se inicia agora em 2021 e vai até 2030. O objetivo principal é unir esforços de todos os setores da sociedade para reverter o ciclo de declínio da saúde do oceano e criar melhores condições para concretizar o desenvolvimento sustentável. No entanto, para que os avanços promovidos ao longo da Década impactem a sociedade para muito além desses dez anos é preciso colocar a comunicação no centro das estratégias.
E foi exatamente isso que a ONU fez. A Década definiu sete resultados para serem alcançados até 2030. Eles respondem à seguinte pergunta: que oceano queremos para o futuro? E um desses resultados esperados é que tenhamos um oceano que inspire e engaje a sociedade, sendo conhecido e valorizado por todos. É justamente nesse ponto que a comunicação se mostra essencial. E é também aí que entra em ação um conceito muito importante para a Década: o de cultura oceânica, que é entender como esse ambiente influencia a nossa vida e de que maneira as nossas ações o influenciam.
A verdade é que a nossa influência sobre o oceano começa em casa. Todo o lixo que produzimos, quando não descartado corretamente, tem grande possibilidade de parar no mar, afetando ecossistemas e a biodiversidade. Um dos grandes problemas atuais são as ilhas de plástico – grandes massas continentais de resíduos descartados de forma irregular, que poluem e causam danos à vida marinha. Nesse sentido, a comunicação tem papel importante para sensibilizar as pessoas e engajá-las para que mudem seus hábitos.
A comunicação tem, portanto, a possibilidade de reverter comportamentos individuais e coletivos em favor de uma cultura oceânica forte e consolidada. É por isso que o Grupo de Assessoramento da Década do Oceano no Brasil, liderado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) – representante científico do País na Comissão Oceanográfica Intergovernamental (COI) da Unesco –, reuniu também jornalistas e divulgadores científicos, que há anos vêm trabalhando em comunicar os temas oceânicos.
Já existem algumas iniciativas de referência nesse sentido. Uma delas é a Maré de Ciência, da Unifesp, proposta inovadora de difusão de conhecimento para fortalecer a interface entre ciência, políticas públicas e sociedade. A ação busca valorizar o papel da ciência em tomadas de decisão. Em 2020, em meio à pandemia, mais de 60 escolas, 130 professores e 2 mil alunos participaram de um desafio para mostrar como instituições de ensino de todo o Brasil, perto ou longe do mar, podem discutir a cultura oceânica.
Outra iniciativa importante, realizada às vésperas do início da Década, foi o Conexão Oceano, evento organizado pela Unesco e pela Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza no Museu do Amanhã, em 2019, que reuniu personalidades, comunicadores, artistas e cientistas para discutir o oceano que queremos. Recentemente, resultou também na publicação Oceano sem mistérios: desvendando os manguezais, cujo objetivo é ajudar cientistas e comunicadores a falarem sobre o assunto de maneira a sensibilizar o público e gerar engajamento.
A partir do momento em que as pessoas entenderem que o oceano começa dentro de casa e pode ser bem cuidado por todos nós com base em gestos simples, a Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável estará no caminho certo para chegar a 2030 atingindo todos os seus objetivos.