Nota de esclarecimento

Na manhã do dia 24 de maio de 2017, um grupo de alunas do Campus Baixada Santista da Universidade Federal de São Paulo foi abordado por dois policiais civis na Rua Silva Jardim, na frente do edifício central, na Vila Matias, e levadas para o 2° DP. Frente ao ocorrido houve uma matéria publicada no dia 24.05.2017 no jornal A Tribuna (edição online), com o título “Estudantes são detidas por fumarem maconha em frente à universidade”.

A referida matéria apresenta uma perspectiva unilateral, com descuido e baseada em dados parciais e mesmo incorretos sobre as alunas e sobre o acompanhamento realizado por professores, uma vez que essas partes, assim como a Unifesp, foram citadas pelo autor da matéria sem o devido cuidado profissional de averiguar suas versões dos fatos, finalizando com a informação de que alguns dos nossos alunos, ao tentar filmar a violação de direitos por parte dos policiais, estariam intimidando os policiais envolvidos no ocorrido.

A título de esclarecimento dos fatos, a abordagem às estudantes ocorreu na calçada oposta à da entrada principal do prédio. Naquele momento dois docentes do campus, que chegaram no portão de entrada do edifício, observaram a movimentação sem perceber que se tratava de uma abordagem policial, uma vez que os policiais civis estavam à paisana. Tampouco estavam as alunas a “fumarem maconha”, como afirma o título da matéria (o que é, inclusive, contradito no corpo da matéria, ao referir que os policiais as viram “realizar um gesto típico de quem confecciona um cigarro de maconha” e por isso foram abordá-las). A princípio, os docentes pensaram então se tratar de uma discussão entre conhecidos e apenas ficaram atentos à possibilidade de violência de gênero.

Contudo, a movimentação ficou mais tensa entre os policiais e as referidas alunas. Nesse momento, outras estudantes que se aproximaram do grupo avisaram os docentes que uma aluna estava sendo algemada. Em função disso, os docentes se aproximaram para se apresentarem aos policiais como docentes da universidade, procuraram acalmar os ânimos dos envolvidos e tomar ciência do que estava ocorrendo. Nesse momento também os policiais se identificaram devidamente, e informaram que as alunas foram flagradas com uma pequena quantidade de maconha e que a aluna fora algemada por se negar a entregar a bolsa para os policiais revistarem, ainda que ela não tivesse se oposto a abrir a bolsa e deixar que seu interior fosse revistado pelos policiais, desde que ela pudesse manter a bolsa em suas mãos.

Os policiais informaram que teriam de levar as alunas para o 2° DP e um deles tentou colocar à força a aluna algemada dentro do veículo que usavam como viatura, que não tinha dentificação visível que demonstrasse que era uma viatura da Polícia Civil. Esse foi o motivo que levou alguns alunos a filmarem as ações, com a intenção de documentar os fatos caso fosse necessário comprová-los, e não de “intimidar os investigadores”, como afirma a matéria.

Os docentes continuaram a intervir, pedindo calma a todos e dizendo aos policiais que as algemas eram desnecessárias, pois as alunas iriam voluntariamente com eles para o 2° DP, como de fato ocorreu após pedido dos docentes. Os ânimos dos envolvidos se acalmaram e a partir de então a comunicação foi feita com serenidade e respeito mútuos, ainda que as alunas demonstrassem estar profundamente assustadas. As algemas foram retiradas e quatro alunas foram colocadas dentro da viatura. Uma docente, reconhecida por seu trabalho e pesquisa no campo de Álcool e outras Drogas, se voluntariou a acompanhá-las dentro da viatura para tentar mantê-las calmas e observar que as alunas tivessem seus direitos respeitados em todos os procedimentos, haja vista o tratamento inicial dispensado às mesmas na abordagem policial e observado pelos dois docentes e demais alunos que assistiram o ocorrido.Embora os policiais legalmente pudessem negar que a docente fizesse o acompanhamento dentro da viatura, eles o permitiram, o que atesta que as relações se sucederam em clima de mútuos respeito e colaboração por todas as partes após a abordagem inicial.

O outro docente também seguiu para o 2º DP em condução própria. No 2º DP houve, de fato, uma conversa envolvendo a docente e o delegado, como a ponta a matéria, em que a primeira perguntou quais seriam os procedimentos adotados pelas autoridades policiais e se as alunas seriam detidas (foi nesse contexto que a docente utilizou coloquialmente o termo “bronca” ao qual a matéria se refere), ao que o delegado informou que elas assinariam um Termo Circunstanciado de Ocorrência e, a partir dele, seriam tomadas as devidas providências pela
Justiça. Os docentes acompanharam todo o processo até a garantia de que as alunas estivessem seguras e mais tranquilas e se retiraram do DP antes mesmo que a última aluna fosse dispensada pelos responsáveis, porque tinham compromissos trabalhistas na universidade e porque confiaram na retidão do trabalho das autoridades. Em nenhum momento houve qualquer tentativa por parte dos docentes de obstruir ou tentar direcionar as ações e os procedimentos policiais.

Feitas as devidas elucidações, reafirmamos assim o lugar da Universidade implicada com a excelência do ensino, da pesquisa e da extensão ancorada na defesa dos direitos humanos. A questão das drogas e seus usos e abusos são questões complexas que exigem mais espaços de
debate. Nesse sentido, os órgãos de comunicação têm um papel relevante para a veiculação de informação correta e qualificada, que é fundamental para se enfrentar tais questões de maneira lúcida e responsável, dentro da legalidade. É lamentável que o jornal A Tribuna tenha deixado de cumprir tal papel ao tratar o fato da forma como o fez na matéria publicada, veiculando informações inverídicas e contraditórias e sem dar voz a todos os envolvidos no fato noticiado.

Por fim, repudiamos toda e qualquer situação que envolva violência e violação de direitos, em especial quando essa advém por parte de agentes do próprio Estado e reiteramos que o acompanhamento realizado pelos docentes se baseou no cuidado à integridade e aos direitos dos alunos desta universidade, que é compromisso público de nossos educadores, e no respeito à autoridade policial e sua função pública.


Prof. Dr. Luiz Passador, Profa. Dra. Maria Inês Badaró, Profa. Dra. Patrícia Borba e Direção do Campus